<!DOCTYPE HTML PUBLIC "-//W3C//DTD HTML 4.0 Transitional//EN">
<HTML><HEAD>
<META http-equiv=Content-Type content="text/html; charset=iso-8859-1">
<META content="MSHTML 6.00.2900.2523" name=GENERATOR>
<STYLE></STYLE>
</HEAD>
<BODY bgColor=#ffffff background=""><FONT face=Arial size=2>
<DIV align=justify>
<HR>
</DIV>
<DIV align=center><STRONG><FONT size=4><FONT size=5><U>boletín informativo - red 
solidaria de revistas</U></FONT><BR><EM><FONT color=#800000 
size=6>Correspondencia de Prensa</FONT></EM><BR>Año IV - 8 de enero 2007 - 
Redacción: </FONT></STRONG><A href="mailto:germain5@chasque.net"><STRONG><FONT 
size=4>germain5@chasque.net</FONT></STRONG></A></DIV>
<DIV align=justify>
<HR>
</DIV>
<DIV align=justify>&nbsp;</DIV>
<DIV align=justify><STRONG><FONT size=3>Brasil</FONT></STRONG></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><STRONG></STRONG></FONT>&nbsp;</DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><STRONG>Entrevista a Roberto 
Romano</STRONG></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><STRONG></STRONG></FONT>&nbsp;</DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><STRONG>"Desde longa data, a esquerda só se 
defende e não ataca”<BR><BR>Mateus Alves e Valéria Nader</STRONG></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><STRONG></STRONG></FONT>&nbsp;</DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><STRONG>Correio da Cidadania Nº 
531</STRONG></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><A 
href="http://www.correiocidadania.com.br/"><STRONG>http://www.correiocidadania.com.br/</STRONG></A></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial size=2><BR><BR><STRONG>Nesta edição 
retrospectiva de 2006, o Correio da Cidadania traz entrevista com Roberto 
Romano, professor do departamento de Filosofia do Instituto de Filosofia e 
Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Romano analisa 
a reeleição de Lula, traça os rumos tomados pelos movimentos sociais no ano que 
termina e faz suas previsões para o novo mandato petista no Planalto, além de 
observar a atuação da esquerda no Brasil de 
hoje.</STRONG><BR><BR><STRONG>Correio da Cidadania: A reeleição de Lula em 2006 
foi para o senhor uma surpresa? O que a teria garantido de forma mais 
proeminente, a seu ver?</STRONG><BR><BR>Roberto Romano: Em primeiro lugar, não 
foi surpresa. Estava evidente que Lula seria reeleito desde o momento em que 
começou a andar pelo Brasil fazendo campanha em pleno cargo, utilizando 
inaugurações de obras públicas, fazendo comícios fora do tempo e contra a lei. 
Sabia também que Lula era uma pessoa que conseguiria reverter a situação adversa 
pela qual passava, já que possui uma capacidade de sobrevivência política que 
raros brasileiros do ramo têm.<BR><BR>O segundo ponto se deve justamente a uma 
desenvoltura da qual ele é dotado para desobedecer à lei e depois dizer que não 
sabe de nada. Além disso, utilizou-se de uma propaganda absolutamente dirigida, 
retoricamente enviesada e cínica, servindo-se de um conjunto de valores 
nacionalistas que ainda existiam na classe média, na classe pobre e sobretudo 
entre os intelectuais para jogar toda essa massa a seu favor.<BR><BR>O último 
fator, que não é o menos importante, é justamente o fantástico apoio que teve 
das elites de que tanto fala mal. Ele foi o candidato preferido dos grupos 
dominantes - evidentemente, Alckmin também tinha uma parte das elites a seu 
lado. Esse foi o seu grande trunfo: falava em espetáculo do crescimento, mas 
sabia - e aí há um dolo absolutamente insuportável para as consciências retas – 
que este não viria, pois tinha um compromisso selado com o setor bancário. Foi 
mais uma fraude eleitoral de Lula em conivência com a elite financeira do 
país.<BR><BR>Posso citar também, como um último ponto que proporcionou a 
reeleição de Lula, a consciência dos setores intelectuais mais à esquerda, que 
foi manipulada e se deixou manipular.<BR><BR><STRONG>CC: Em um cenário marcado 
por extrema desertificação de idéias, percebe-se, já há alguns anos, que as 
análises retrospectivas dos anos que se vão não trazem grandes novidades, pelo 
menos, as alvissareiras: crescimento pífio, escândalos políticos, desmobilização 
social e descrença popular generalizada repetem-se sucessivamente. O senhor 
acredita que 2006 foi diferente?</STRONG><BR><BR>RR: O ano foi fértil em 
aumentar esse ceticismo observado anteriormente. No entanto, não diria que isso 
é um problema proveniente do presidente da República ou do Partido dos 
Trabalhadores, mas sim um problema que existe em todo o Estado brasileiro, cujos 
três componentes - Executivo, Legislativo e Judiciário - deram passos vigorosos 
para se afastar da cidadania.<BR><BR>Não é por acaso que, em pesquisas sobre a 
consideração dos brasileiros e dos sul-americanos pela democracia, 37% dos 
entrevistados se mostraram favoráveis a um regime ditatorial. Esses índices 
diminuíram um pouco, mas nada que seja significativo; continua existindo – e 
aumentando tendencialmente - esse fosso entre os que pagam impostos e os que 
supostamente deveriam ser, na democracia, os seus funcionários.<BR><BR>Temos por 
exemplo, no Judiciário, um Conselho Nacional de Justiça que defende mais os seus 
salários e seus interesses privados, particulares e corporativos do que enfrenta 
as grandes crises da República. No Legislativo, há esse absoluto deboche das 
absolvições no caso do mensalão, das denegações de voto claro e aberto e esse 
aumento absolutamente estapafúrdio dos vencimentos dos parlamentares - que, 
aliás, segue a mesma tendência observada no Judiciário.<BR><BR>Tudo isso 
certamente não trará bons augúrios para o Brasil. Eu gosto sempre de lembrar, e 
isso contra muita gente que gosta de criar uma consciência feliz e mentirosa, 
que o golpe de Estado em 1964 teve o apoio de boa parte da população brasileira. 
Se naquele momento, com o nível de corrupção que existia - é bom lembrar que os 
golpistas disseram que iriam lutar contra os comunistas e também contra a 
corrupção -, havia uma espécie de saturamento da cidadania em relação aos 
representantes, hoje a coisa é muito pior.<BR><BR>Tenho muito receio que 
tenhamos no horizonte uma aventura populista que pode ser à esquerda, à direita 
ou ao centro. Essa aventura, se prometer fechar o Congresso, terá o apoio de boa 
parte da população do Brasil, e isso é lamentável.<BR><BR><STRONG>CC: É corrente 
a avaliação quanto à desmobilização a que foram levados a sociedade civil e os 
movimentos sociais ao longo do mandato de Lula. Qual a sua avaliação quanto à 
atuação desses movimentos nesse ano de 2006? Houve algum tipo de rompimento com 
a inércia anterior?</STRONG><BR><BR>RR: Veja, cada movimento está em um momento, 
cada um tem o seu problema estratégico. Se os tratamos abstratamente e 
generalizarmos, parecerá que todos fazem a mesma coisa, e por isso é bom 
analisá-los separadamente.<BR><BR>Um movimento que não se desarmou e se manteve 
como uma referência nacional, tanto do ponto de vista ético como político, foi o 
movimento ecológico. A ministra Marina Silva é um dos poucos integrantes do 
governo Lula de quem não há do que se envergonhar - pelo contrário, há muito do 
que se orgulhar.<BR><BR><STRONG>CC: Mas algumas figuras tradicionais da esquerda 
ligadas ao meio ambiente criticam de forma ostensiva a atuação da 
ministra.</STRONG><BR><BR>RR: Bom, eu estou pensando em sua média dentro do 
ministério, não estou comparando com quem está fora dele. Há uma linha que 
chegou ao poder e está tentando fazer tudo contra um governo que possui uma 
aliança estratégica com os grandes produtores do agronegócio, e aqueles que 
estão dentro da sociedade civil e fazendo críticas à ministra. Isso mostra que o 
movimento não está desarmado, que tem a sua presença.<BR><BR>Já o movimento 
estudantil é quase uma piada. Ele não existe e é quase totalmente dirigido pelo 
governo, está totalmente cooptado. Quem militou no movimento estudantil como eu, 
que o fiz desde 1962, sabe identificar perfeitamente quando se fala com uma 
pessoa cooptada pertencente a um movimento inexistente.<BR><BR><STRONG>CC: As 
manifestações ocorridas na cidade de São Paulo em protesto contra o aumento da 
tarifa de ônibus não ocorreriam, então, se o governo paulistano pertencesse ao 
PT?</STRONG><BR><BR>RR: Exatamente, não. O presidente da UNE faz parte do 
Conselho da República. Você ouviu alguma manifestação dele contra o corte de 
recursos do CNPq e do CAPES? Nenhuma. É realmente um movimento que está nas mãos 
de aparelhos políticos, com uma mentalidade extremamente estrita.<BR><BR>Sobre o 
movimento negro, existem setores excelentes, que continuam a sua luta, e há 
setores que atenuaram a sua capacidade de ataque esperando que o governo 
realizasse modificações estruturais que os beneficiariam - caso da confiança no 
ProUni por parte daqueles que defendem as cotas. É um escândalo que alguém que 
sempre defendeu a escola pública, gratuita, de qualidade, republicana e 
universal, e que se transformou de repente num grande aliado do governo que está 
dando milhões para os industriais da educação de terceiro grau, não seja 
criticado pelo movimento negro.<BR><BR>Entende-se a situação do movimento e a 
delicadeza da questão, mas não por que essa interrupção da crítica quando se 
trata do ProUni. Isso é complicado e precisa ser dito para o movimento negro, 
pois uma coisa é o governo, outra coisa é o tipo de trato que o governo está 
tendo com os donos do país.<BR><BR>Itamar Franco, através do ministro Murilo 
Hingel, fechou o Conselho Federal de Educação pelas mesmas coisas que nele 
ocorrem hoje. Em São Paulo, há universidades que simplesmente implementaram um 
curso de Direito de forma ilegal, sem autorização das instâncias governamentais 
- e os mesmos que fizeram isso têm assentos no Conselho!<BR><BR>São questões 
desse tipo que são insustentáveis, não apenas do ponto de vista do antigo 
programa do Partido dos Trabalhadores, mas de toda a tradição de luta pela 
educação que vem desde Florestan Fernandes e Anísio Teixeira. O que se faz é 
encher as burras desses empresários do ensino privado, dizendo que isso é uma 
maravilha e até usando tal fato como propaganda. E não há uma palavra crítica do 
movimento negro em relação a isso. Eu sei que é polêmico o que eu digo, mas é 
preciso justamente uma polêmica para se chegar a algum consenso menos ambíguo 
nessa República.<BR><BR><STRONG>CC: E em relação ao movimento sem terra no país, 
como o senhor avalia suas ações em 2006?</STRONG><BR><BR>RR: Os sem terra 
continuaram a sua luta. Inclusive, acredito que estejam em um compasso de 
espera, pois tiveram uma atitude de não atrapalhar a reeleição do presidente, 
com um recuo tático. No entanto, sabem que, devido à aliança do Planalto com o 
agronegócio, terão que forçar o governo para que suas reivindicações sejam 
atendidas. Particularmente, acredito que, com tal aliança, podemos esperar nas 
próximas ocupações uma participação mais forte da polícia em termos de repressão 
ao MST e outros movimentos.<BR><BR><STRONG>CC: Qual a sua opinião quanto aos 
movimentos populares e setores autenticamente de esquerda que se decidiram pelo 
apoio crítico e condicionado a Lula no segundo turno? Esse apoio pode ter criado 
algum tipo de cumplicidade positiva para o futuro?</STRONG><BR><BR>RR: Acredito 
que, nesse ponto, é preciso utilizar a linguagem antiga do marxismo: existem 
condições objetivas e condições subjetivas. As condições subjetivas foram 
empreendidas e os movimentos que apoiaram a reeleição esperam que o governo não 
retribua com opressão. Isso é o mínimo.<BR><BR>Agora, as condições objetivas são 
independentes, inclusive da vontade dos líderes desses movimentos. Por exemplo, 
se o governo continua a não prestar atenção à questão agrária, a não tomar 
atitudes voltadas à reforma agrária e privilegiando o agronegócio, é evidente 
que um momento de luta vai ocorrer, e aí ficará clara a posição do presidente. 
Se me perguntar honestamente o que acho, creio que Lula terá toda a latitude de 
chamar a polícia para reprimir o MST.<BR><BR><STRONG>CC: Em entrevista concedida 
ao Correio no começo desse semestre, quando a reeleição parecia garantida já no 
primeiro turno, o senhor prognosticou um governo subjugado pelas oligarquias 
regionais do PMDB. Como acredita que transcorrerá, politicamente, o segundo 
mandato de Lula?</STRONG><BR><BR>RR: Essa “previsão” que fiz é o que está 
acontecendo hoje, infelizmente minha bola de cristal funcionou. O segundo 
mandato será muito complicado, pois as oligarquias peemedebistas - que têm o seu 
correspondente na oposição nas oligarquias do PFL - possuem um longo treino de 
controle das instituições públicas regionais e nacionais, não brincam em 
serviço. São profissionais no assunto. Veremos como Lula irá distribuir cargos e 
ministérios; a fome de poder do PMDB é imensa, e todas as alas do partido têm a 
intenção de apoiar o presidente esperando o retorno em cargos.<BR><BR>É bom 
lembrar que a expressão "é dando que se recebe" foi criada no seio do PMDB. Se o 
presidente conseguir desalojar o PT de muitos cargos em estatais, ministérios 
etc., e se conseguir colocar o PMDB em uma posição privilegiada, terá pelo menos 
dois anos para realizar o seu programa. Nesse momento, eu digo para você que meu 
temor é se ocorrerá a flexibilização das leis trabalhistas, a diminuição do peso 
do orçamento da saúde - colocando o saneamento base como parte desse mesmo 
orçamento -, e se a coisa seguirá o mesmo caminho de embromação na questão do 
ensino público.<BR><BR>Caso Lula tenha esse apoio sólido do PMDB, é isso o que 
fará, algo que agrada profundamente as elites do país, pois estará sendo 
cumprido o “programa” a elas prometido.<BR><BR><STRONG>CC: A surpresa do segundo 
turno levou o candidato petista, ainda que estrategicamente, a acirrar a 
polarização do cenário eleitoral, tomando a crítica às privatizações como fio 
condutor dessa polarização. O senhor acredita que isso terá algum reflexo na 
próxima gestão?</STRONG><BR><BR>RR: Não terá nenhum. O que se nota no PT, pelo 
menos desde a "Carta aos Brasileiros", é uma disposição de fazer todo o serviço 
necessário para as políticas macroeconômicas e outras que interessam às elites. 
Há um realismo absoluto, uma falta de trato com valores. Tornou-se quase um 
refrão do presidente da República ou caçoar ou ironizar ou indicar como loucura 
todos os valores carregados pela esquerda até os dias de hoje.<BR><BR>Lula exibe 
uma espécie de “corrosão ética” causada pelo realismo político. Quem estuda 
história sabe o resultado disso: sempre que há governantes que operam sem 
referências axiológicas e valorativas, o resultado é um autoritarismo muito 
grande a serviço de alguns setores da sociedade que se posicionam contra a 
maioria. Nesse caso, isso está explícito; para cumprir as exigências do setor 
financeiro e industrial, Lula tentará novamente uma depuração da reforma da 
Previdência e a flexibilização dos direitos trabalhistas. Dado o que o 
presidente já exibiu de ousadia, a CLT será duramente atacada em 
2007.<BR><BR><STRONG>CC: Como será, em sua opinião, a atuação da oposição ao 
governo petista durante os anos do próximo mandato?</STRONG><BR><BR>RR: A 
oposição terá um trabalho duro pela frente. Nesse momento, você tem uma maré 
montante; lembro-me que, no início do governo Collor, boa parte das 
universidades aderiu ao governo de plantão, e houve uma espécie de inexistência 
da oposição. O único partido que se opôs com firmeza ao presidente, que depois 
sofreria impeachment, foi o PT. Hoje, não consigo ver nenhum partido que tenha 
essa firmeza e a amplitude que o PT teve.<BR><BR>No caso do PFL, trata-se de um 
partido que é uma federação de oligarquias regionais, mas cujos líderes foram 
duramente batidos ou se afastaram - caso de Antônio Carlos Magalhães e de Jorge 
Bornhausen. Marco Maciel sempre foi uma pessoa conciliadora, sempre afeita a 
gestos espetaculares de oposição. Sobra o César Maia no Rio de Janeiro, mas ele 
não possui abrangência nacional.<BR><BR>Já os tucanos, como era de se esperar, 
estão em pleno namoro com os primos petistas. Fazem tudo para que o programa do 
presidente da República seja cumprido, pois nisso eles são iguais: ambos 
defendem a flexibilização das leis trabalhistas e tudo o que se chama de 
"modernização". Ambos têm o mesmo programa, fato que faz com que, no Congresso, 
o PSDB não seja exatamente oposição.<BR><BR>Além disso, o PSDB perdeu a dimensão 
de Estado que seria alternativa à trazida pelo grupo petista no poder. O único 
setor que possui uma visão de desenvolvimento econômico e de modificação do 
Estado alternativa é o grupo liderado por José Serra; talvez se possa entrever 
alguma oposição a partir de São Paulo, mas convém lembrar que o governador do 
estado terá suas mãos atadas, do ponto de vista fiscal, pelo governo federal - e 
isso faz com que também não se possa esperar de Serra uma oposição 
virulenta.<BR><BR>Aécio Neves, por outro lado, continua sua lua de mel com o 
presidente Lula, na esperança de que possa ser indicado para sucedê-lo. Aí será 
mais uma desesperança que conheceremos e mais uma falta de compromisso com o 
papel de oposição que deveria desempenhar. Se o governo de São Paulo, o governo 
de Minas Gerais e o governo do Rio Grande do Sul se unissem na oposição, seria 
uma frente respeitável, mas todos estão entregues ao Ministério da 
Fazenda.<BR><BR><STRONG>CC: Quem é, essencialmente, a esquerda no país hoje? 
Como o senhor avalia a sua atuação nesse ano eleitoral?</STRONG><BR><BR>RR: Há 
um bom tempo costumo definir a esquerda e a ex-querda. Às vezes, determinada 
pessoa começa um discurso ou uma prática com o “s” e termina com o “x”; Lula é 
um bom representante da ex-querda.<BR><BR>Eu diria que são muito poucas as 
lideranças de esquerda que têm representatividade popular e condições de mover 
multidões em termos eleitorais. Felizmente, a cláusula de barreira não passou, e 
o PSOL terá uma oportunidade de se expandir sem a popularidade de uma pessoa só, 
como foi o caso de Heloísa Helena.<BR><BR>Por outro lado, sobra muito pouco de 
membros da esquerda com “s”. Dentro do PT, existem grupos que se dizem como 
sendo de esquerda, mas se calam frente às atitudes e decisões do grupo dominante 
e do governo. Estive recentemente com Raul Pont, em Porto Alegre, e observei 
algo que alcançava níveis esquizofrênicos: ao mesmo tempo em que criticava Lula, 
apoiava o governo e a caçada à imprensa que promovem. A esquerda dentro do PT 
está de tal maneira dividida, inclusive mentalmente, que acaba com suas 
possibilidades de criar uma estratégia única de atuação nacional. Há também 
alguns grupos trotskistas dentro do PT, mas esses nunca chegaram a empolgar nem 
mesmo a máquina petista.<BR><BR>O PCdoB, o PDT e outros, eu me recuso a 
considerá-los como representantes da esquerda clássica. Uma coisa é o discurso, 
mas os atos desses partidos mostram que eles têm muito pouco dos ideais 
democráticos da esquerda e têm muito de realismo político - para não utilizar 
outra palavra mais pesada.<BR><BR>Gostaria de salientar também, ainda sobre o 
mesmo tema, que existem diferenças entre as tendências e entre os indivíduos. 
Não gostaria de dizer que Aldo Rebelo, por exemplo, é uma pessoa sem 
características positivas, pois ele vem cumprindo bem o seu papel na Câmara, é 
um homem de muito diálogo. Mas ele pertence a uma máquina e não é um indivíduo 
isolado. Muitas vezes, essa máquina assume um ritmo e um modo de compromisso que 
atropela os seus próprios integrantes, sejam eles grandes ou 
pequenos.<BR><BR><STRONG>CC: O que configuraria, no atual momento histórico, um 
autêntico e possível projeto de esquerda?</STRONG><BR><BR>RR: O imaginário da 
esquerda é marcado pela Revolução Francesa, pelos ideais de liberdade, de 
igualdade e de fraternidade, e isso precisa ser repensado. O que vemos é que 
hoje ele é cada vez mais atenuado na esquerda mundial. Usam os ideais, mas fazem 
concessões cada vez mais graves em um plano conjuntural.<BR><BR>A esquerda 
precisa deixar de reagir à conjuntura, deixar de se prender nas armadilhas do 
cotidiano e precisa repensar a história do mundo hoje, quais as grandes linhas 
de força da vida, da cultura e da economia mundiais e verificar o que se pode 
fazer no Brasil. O método da Revolução Francesa precisa - e muito - ser 
ampliado; há pessoas na esquerda que não possuem sequer uma abertura intelectual 
para acompanhar o que faz seu inimigo. De cem pessoas que combatem o 
neoliberalismo, se duas leram textos de algum neoliberal é muito.<BR><BR>É 
necessário que se volte a um esforço de pensamento, a uma erudição. É bom 
lembrar que as grandes personalidades da esquerda da modernidade tinham uma 
cultura muito grande dos projetos que combatiam, e não apenas reiteravam suas 
próprias teses. Não existem, hoje, fóruns de trabalho que não sejam de 
reiteração de crenças - caso do Fórum Social Mundial. Ali há coisas admiráveis, 
mas há muito pouco trabalho de trocas intelectuais.<BR><BR>Se você analisa os 
textos de Marx, vê-se que ele era crítico-leitor extremamente aguçado de Ricardo 
e de Adam Smith. Lênin também, assim como Gramsci. Estes tiveram uma abertura 
para analisar e entender o que os donos do mundo faziam e, a partir desse 
conhecimento, propor um discurso e uma prática contrária. <BR><BR>Resumindo, a 
esquerda não pode se contentar mais com manuais. Ou recupera essa dimensão de 
ciência, de conhecimento e de prática, ou irá morrer na praia, recitando slogans 
que apaziguam a sua consciência, mas que não mudam nada nas relações sociais. 
<BR><BR><STRONG>CC: Qual seria, a seu ver, ainda que idealmente, o caminho que 
abriria uma autêntica possibilidade de transformação em nosso 
país?</STRONG><BR><BR>RR: Um elemento urgente seria que grupos variados, de 
dentro e de fora das universidades, criassem instâncias de análise de pesquisas 
e de divulgação de dados e propostas, de tal modo que não houvesse apenas uma 
resposta automática ao desafio, mas uma luta dirigida por idéias muito claras. 
Essa atitude reativa é algo muito sério e preocupante. Desde longa data, a 
esquerda está apenas se defendendo e não ataca.<BR><BR>Para atacar, é necessário 
conhecer o terreno do adversário, e para isso a esquerda precisa de uma dose 
imensa de diálogo interno. Os anátemas no interior da esquerda se tornaram 
cotidianos; se alguém discorda da análise de um guru qualquer, ele já se torna 
de direita, já virou tucano. Isso também precisa ser pensado, antes do 
xingatório e da classificação, através do retorno ao diálogo, do trabalho comum, 
da troca de informações, sem que a discordância se transforme imediatamente em 
anátema. Esse foi o elemento que desgraçou a esquerda durante o domínio do 
Partido Comunista soviético, que criou a intolerância dos partidos da esquerda e 
que resultou nessa miríade de grupos impotentes que não conseguem sequer fazer 
oposição a um partido importante como o PT.<BR><BR>É necessário não um 
desarmamento, não uma bondade, mas sim um trabalho refletivo de abrir a cabeça 
de um grupo em relação ao outro, esquecendo momentaneamente a lógica de sua 
facção e pensando mais na lógica de um todo. 
<HR>
<STRONG><EM><FONT color=#000080 size=3>La información difundida por 
Correspondencia de Prensa es de fuentes propias y de otros medios, redes 
alternativas, movimientos sociales y organizaciones de izquierda. Suscripciones, 
Ernesto Herrera: </FONT></EM></STRONG><A 
href="mailto:germain5@chasque.net"><STRONG><EM><FONT color=#000080 
size=3>germain5@chasque.net</FONT></EM></STRONG></A> 
<HR>
</FONT></DIV></BODY></HTML>