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<DIV align=center><STRONG><FONT size=4><U><FONT face=Arial>boletín solidario de
información<BR></FONT></U><FONT face=Arial color=#800000 size=5>Correspondencia
de Prensa <BR></FONT><U><FONT face=Arial>26 de diciembre
2010<BR></FONT></U><FONT face=Arial><FONT color=#800000 size=5>Colectivo
Militante - Agenda Radical<BR></FONT>Gaboto 1305 - Montevideo -
Uruguay<BR>redacción y suscripciones: </FONT></FONT></STRONG><A
href="mailto:germain5@chasque.net"><STRONG><FONT face=Arial
size=4>germain5@chasque.net</FONT></STRONG></A></DIV>
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<HR>
</FONT></DIV>
<DIV><FONT face=Arial></FONT> </DIV>
<DIV><FONT face=Arial size=3><STRONG>Brasil de Lula</STRONG></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><STRONG></STRONG></FONT> </DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial><STRONG>Entrevista a Nildo
Ouriques</STRONG></FONT></DIV>
<DIV align=justify><STRONG></STRONG> </DIV>
<DIV align=justify><STRONG><FONT face=Arial>A</FONT> </STRONG><FONT face=Arial
size=2><STRONG><FONT size=3>naturalização da desigualdade
<BR></FONT></STRONG></DIV></FONT>
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<DIV align=justify><FONT face=Arial size=2></FONT> </DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial size=2><STRONG>Valéria Nader e Gabriel
Brito, da Redação </STRONG></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial size=2><STRONG>Correio da
Cidadania</STRONG></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial size=2><A
href="http://www.correiocidadania.com.br/"><STRONG>http://www.correiocidadania.com.br/</STRONG></A></FONT></DIV>
<DIV align=justify><FONT face=Arial size=2></FONT> </DIV><FONT face=Arial
size=2>
<DIV align=justify><BR>Nesta entrevista especial, o Correio da Cidadania
conversou com o economista Nildo Ouriques, também membro do Instituto de Estudos
Latinos-Americanos da UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina -, para
fazer um balanço dos anos Lula e analisar as pré-condições, algumas já
anunciadas, do governo Dilma. Para ele, a principal função exercida pelo governo
foi a de "refuncionalizar o neoliberalismo". Ao mesmo tempo, desqualifica a
suposta ascensão social do povo brasileiro, pois se baseia "nos critérios
inaceitáveis do Banco Mundial". </DIV>
<DIV align=justify><BR>Em sua opinião, o maior ‘legado’ deixado pelo último
governo é a constatação de que não é possível alcançar mudanças profundas pelo
atual modelo de democracia. Nildo não enxerga muitas possibilidades de o futuro
Congresso e Executivo levarem adiante pautas mais progressistas, que garantam
maior emancipação popular. Longe disso, devem prosseguir as políticas
assistencialistas e a usurpação do Estado em favor das grandes indústrias
agrícola e mineral. "Controle eleitoral e alienação política". </DIV>
<DIV align=justify><BR>Apesar da falta de esperanças no novo governo, o
economista espera que Dilma reforce laços com a esquerda latino-americana,
abandonando os anseios sub-imperialistas que detecta em nossa política externa.
Assim, antes de discutir qual a característica do capitalismo brasileiro, Nildo
reclama pela reorganização de uma esquerda socialista e nacionalista, fazendo
uma análise das condições de nosso país e pensando numa ‘revolução brasileira’,
que inevitavelmente se diferencia das condições de outros processos tomados até
hoje como referência. A entrevista completa pode ser conferida a seguir.
<BR><STRONG> <BR>Correio da Cidadania: Qual o seu balanço dos oito anos do
governo Lula? <BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Uma refuncionalização do
chamado neoliberalismo. Aplicou a consolidação do PT como partido de
centro-direita, que detinha a legitimidade para falar sobre os pobres e,
portanto, aplicar políticas de sensibilidade social. Mas no sentido de colocar
os pobres em políticas caritativas, o que é o Bolsa família basicamente, apesar
de sua importância. Este é o ponto fundamental. Não emancipa amplos setores dos
trabalhadores, atende à questão social, diferenciando-se da direita clássica,
mas sem emancipar politicamente. Controle eleitoral e alienação política. Eis o
primeiro movimento. <BR> <BR>Em segundo lugar, aceita o papel de potência
regional dentro da política externa estadunidense, o que implica maiores graus
de autonomia em relação à diplomacia do FHC, impulsionando uma política
sub-imperialista do Brasil, que de fato tenta praticá-la. Especialmente num
período em que o mercado interno se mostra restrito para as necessidades de
acumulação de capital das burguesias brasileiras. De maneira que se forma uma
combinação. <BR> <BR>E, claro, politicamente produz outro fato importante:
dentro do atual sistema político não é possível uma alternativa eleitoral. A
domesticação do PT significa a caducidade do sistema político, que tinha sido
caracterizado pela possibilidade de o PT, dentro das regras do jogo, impulsionar
um governo democrático-popular, um mercado interno de massas e, portanto,
iniciar o que Florestan Fernandes chamava de revolução democrática.
<BR> <BR>Dentro de todo esse contexto da política, a característica
essencial do Lula neste governo foi a de jamais convocar o povo para uma luta
importante. Jamais chamou o povo para enfrentar algum interesse majoritário da
burguesia. Essa é a característica essencial. <BR> <BR><STRONG>Correio da
Cidadania: Já há alguns anos, desde a chegada de Lula, nos deparamos com as
estatísticas que apontam maiores índices de crescimento do PIB e do emprego, ao
lado do maior valor dos rendimentos... <BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques:
Como diria Álvaro Vieira Pinto – e pode escrever isso -, o que é o PIB?
Construir e destruir uma casa entra no cálculo. O PIB diz muito pouco. Discutir
se ele cresceu, baixou... Já está na hora de superarmos isso. Taxas de
crescimento, taxas de acumulação de capital que ultrapassem 5%, 6%, 7%, taxas
chinesas, num país tão desigual como o nosso não significam muita coisa.
<BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: No entanto, esses fatores citados,
aliados aos maiores reajustes concedidos ao mínimo e ao incremento das políticas
assistencialistas, como o Bolsa Família, respaldam várias análises sobre a
redução da pobreza e da miséria e a ascensão à classe média de uma parte da
população. Qual é o significado, ou o teor de verdade, dessas análises?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Bem, se continuarmos adotando como
critério de pobreza o critério do Banco Mundial, de US$ 1,3 diário... Mas
ninguém aí no Correio da Cidadania aceitaria para si próprio esse padrão. US$
1,30 faz parte de uma metodologia do Banco Mundial. Ninguém da imprensa, ninguém
que ler isso, toparia entrar na classe média nesses termos. <BR> <BR>O fato
é que 76% da População Economicamente Ativa ganha até 3 mínimos, 1500 reais.
Significa que o poder de compra do mercado interno é limitado. <BR> <BR>E
essa onda, mais intensa até setembro de 2008, já começou a desaparecer em várias
partes do globo, nos EUA, Europa, Ásia, Oriente Médio e também na América
Latina. No Brasil, vai se manifestar tardiamente, mas não tenha dúvida de que o
emprego vai se reduzir e inclusive os salários com carteira assinada de quem
está sendo contratado agora estão em níveis mais baixos que aqueles anteriores.
<BR> <BR>De maneira que não podemos tomar esse momento absolutamente
passageiro como uma tendência do capitalismo brasileiro. O que se confirma é o
contrário: a super-exploração dos trabalhadores. Exatamente quando o período de
acumulação foi mais intenso, com taxas de crescimento mais altas, a resistência
à redução da concentração da renda também foi muito intensa.
<BR> <BR>Portanto, temos de sair desse imaginário católico – da exclusão,
da pobreza – e do discurso tecnocrático que interessa tanto a Lula quanto a FHC,
tanto a tucanos como a petistas, ou seja, ao consórcio petucano.
<BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: Então, toda essa cadeia de fatores
mencionados como positivos aos quatro ventos pode ser desqualificada, uma vez
que passou longe de reduzir as abissais desigualdades do país? </STRONG></DIV>
<DIV align=justify><BR>Nildo Ouriques: Dá pra desqualificar no sentido de que a
pobreza está sendo reduzida, mas não está sendo enfrentada estruturalmente. Os
programas de alcance e certa sensibilidade popular não reduzem a pobreza, ainda
que tirem momentaneamente alguns da linha de pobreza e miséria - sob os
critérios inaceitáveis do Banco Mundial. <BR> <BR>Assim, todo esse
crescimento foi não apenas abaixo do que se propagandeia, como também foi abaixo
do que o país precisava para se tornar protagonista mundial e fazer um ajuste de
contas com sua história. <BR><STRONG> <BR>Correio da Cidadania: Como você
avalia o processo eleitoral que culminou na vitória de Dilma Rousseff?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Em primeiro lugar, a esquerda radical com
a qual me alinho não existiu eleitoralmente. Em segundo lugar, precisamos de um
amplo, que será lento, processo de reconstrução de uma esquerda socialista,
nacionalista e revolucionária no Brasil. É um longo processo. Em terceiro,
precisamos disputar tanto no meio social quanto no meio eleitoral. E em quarto,
a hegemonia burguesa no processo eleitoral foi completa, porque, a rigor, as
diferenças entre Dilma e Serra eram anedóticas, e não substanciais.
<BR> <BR>Desse modo, o processo eleitoral se caracterizou por não passar o
país a limpo. O que significa que hoje, concretamente, o processo eleitoral não
é um instrumento de mudança no Brasil, mas de manutenção da ordem.
<BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: A atuação da esquerda socialista
nesta eleição, representada essencialmente pelo PSOL, PCB, PSTU e PCO, não
existiu, a seu ver? <BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Eleitoralmente não
existimos, não há como ter ilusões sobre isso. Mas acho que também se alimentou
uma indiferença ao processo eleitoral. Nossa insignificância eleitoral mostra
que temos escassos vínculos sociais com o que há de organizado no povo. Essa é a
gravidade da situação. <BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: A expressiva
votação obtida por Marina deve ser encarada como um capital para que a candidata
se confirme como força política de peso no país, carregando a bandeira da
Terceira Via e do Ambientalismo, ou estamos diante de mais um fenômeno eleitoral
que, como tantos, tende a, mais dia menos dia, se esgotar?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: A candidatura da Marina foi uma fraude
completa. No sentido de que ela é uma lulista, uma expressão do cinismo moderno
na política. Fica sete anos como ministra do Lula e aparece na última hora se
apresentando como alternativa. <BR> <BR>Além disso, aparece com o discurso
da cordialidade brasileira, querendo eliminar as pequeníssimas divergências do
consórcio petucano. <BR> <BR>Em terceiro, uma representante do discurso
ecologista absolutamente dentro da ordem. Não tem anti-imperialismo e nem
anti-capitalismo no discurso dela. <BR> <BR>E além do mais, há um outro
prejuízo notável: ela é expressão de evangelização da política, o fenômeno
político mais nocivo que ocorreu no Brasil nos últimos anos. A República é
laica, a política é laica, portanto: fora o discurso religioso, fora o crucifixo
da sala de aula. <BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: Ainda assim ela não
pode se impulsionar no cenário político, mediante a votação que obteve esse ano
e a clara falta de opções políticas nas disputas? <BR></STRONG> <BR>Nildo
Ouriques: Espero que não. Não creio que ela vá se alavancar assim. Acho que o
futuro será mais complicado para ela. <BR><STRONG> <BR>Correio da
Cidadania: Qual a sua avaliação da nova composição ministerial, destacando-se as
incisivas exigências do PMDB para aumentar a sua cota de participação...
<BR>Nildo Ouriques: Expressa a mesma composição social, a mesma priorização do
Congresso, a mesma correlação de forças, o mesmo projeto. Continuidade completa.
Os ministros hoje são absolutamente incapazes de assinalar algum rumo.
<BR></STRONG> <BR>O ministro da Fazenda? Funciona com base no consenso
formulado pela FEBRABAN, FIESP, latifúndio, Banco Mundial, FMI... Enfim, nenhum
ministro se destaca em nada. <BR></DIV>
<DIV align=justify><STRONG>Correio da Cidadania: E quanto à troca de comando no
Banco Central e a saída de Celso Amorim do Ministério das Relações Exteriores,
considerado como um dos ministros que se mantiveram entre a ala progressista na
Esplanada lulista, a despeito de críticas em contrário?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Acho que a passagem do Celso Amorim foi
positiva no sentido de que começou a abandonar, ao menos em alguns casos, a
clássica subalternidade do Itamaraty à embaixada de Washington. Mas estivemos
longe de uma política externa independente, muito longe.
<BR><STRONG> <BR>Correio da Cidadania: Além de ter externado preocupações
com o alegado déficit da previdência, justificando ser impossível aumento dos
benefícios acima do mínimo, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, já
apresentou uma proposta de política fiscal para o país, cuja essência é que as
despesas correntes primárias cresçam menos que o Produto Interno Bruto (PIB).
Sabendo-se que essas despesas incluem os salários do funcionalismo, a
previdência e assistência social, podemos esperar medidas duras de restrições
aos gastos sociais? <BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: No primeiro ano,
haverá um programa de ajuste fiscal óbvio para preparar o segundo ano, com as
eleições para prefeito e criação dos futuros comitês municipais para as eleições
de 2012. Em primeiro lugar, portanto, vem o calendário político.
<BR> <BR>Em segundo lugar, existe uma necessidade de sair da ordem de
acumulação de capital em escala mundial. Mas não haverá um ajuste de magnitude,
tal como o grego ou o irlandês, pois o reforço da condição de nosso país como
exportador de produtos agrícolas e minerais, o que gerou este ano uma renda de
quase 45 bilhões de dólares, criou um colchão que consolida uma estrutura de
país tipicamente subdesenvolvido. <BR> <BR>Portanto, o ajuste não precisa
ser tão intenso quanto em outras circunstâncias seria. Se houver uma redução
global dos preços das mercadorias, daí o ajuste tende a ser permanente. Não é,
no entanto, o que está se desenhando. <BR> <BR><STRONG>Correio da
Cidadania: O que pensa sobre a maioria parlamentar obtida pelo governo no
Congresso a partir dessas eleições, considerando-se a bancada formada por PT,
PMDB e demais partidos aliados, ao lado da regressão do PSDB e DEM? Será
azeitado o percurso rumo ao desmonte de direitos sociais, ou há uma remota
chance de esta maioria governista trabalhar em favor de algumas pautas
progressistas, como reforma agrária, direitos sociais e de minorias?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Absolutamente normal a formação dessa
maioria. Qual governo do Brasil não conseguiu uma maioria parlamentar? Os erros
de campanha do PSDB e do DEM cobraram seu preço, mas não alteram em nada a
República. O presidente sempre faz a maioria que quer. <BR> <BR>E não vejo
nenhuma possibilidade, longe disso, de tais pautas progressistas serem levadas
adiante. A bancada é tão fiel ao governo quanto disciplinada no programa
predominante. <BR> <BR>O parlamento não tem capacidade de impor uma pauta
ao Executivo nacional. E não o fará. <BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania:
O historiador Mário Maestri relata que o atual momento eleitoral retrata
‘Derrota Histórica do Mundo do Trabalho’, algo que já estaria inscrito na
primeira eleição de Lula à presidência, uma vez que a liquidação da autonomia
política dos movimentos sociais foi a condição imposta pela burguesia para a
entrega do governo a Lula. O que pensa disto? <BR></STRONG> <BR>Nildo
Ouriques: Acho que há aí um pouco de uma leitura saudosista do que foi o Lula.
Em segundo lugar, mundo do trabalho é uma expressão muito cara a Jose Marti, que
a usou em 1883, quando falava sobre a morte de Marx. Mas a chamada derrota dos
trabalhadores teria de ser discutida mais longamente. <BR> <BR>O chamado
novo sindicalismo nunca aceitou uma análise do subdesenvolvimento e da
dependência. Quero dizer que o novo sindicalismo sempre duvidou que o
capitalismo no Brasil fosse incapaz de atender as maiorias. E o Lula, ainda que
combativo naquelas épocas, era mais expressão de uma revolta contra a
super-exploração do trabalho, tal como formulou Rui Mauro Marini em Dialética da
Dependência, do que de um projeto socialista. <BR> <BR>Portanto, isso
precisa ser melhor avaliado em termos históricos. <BR> <BR><STRONG>Correio
da Cidadania: Qual a sua avaliação da atual conjuntura internacional e nacional,
no que se refere à crise financeira que explodiu em 2008? A despeito do caráter
mais estrutural da crise, a conjuntura econômica estabilizou-se realmente, ainda
que países europeus mais fragilizados, como Irlanda, pareçam ser a bola da vez?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: A atual conjuntura internacional é
favorável aos trabalhadores. Desde setembro de 2008 mudou a conjuntura mundial.
O encanto do capitalismo foi quebrado por uma crise que causou a perda de 50
milhões de empregos, colocando uma quantidade impressionante, mais de 40
milhões, abaixo da linha de pobreza. <BR> <BR>A crise não terminou e nem
vai terminar. Significa que esse capítulo segue em aberto. Os trabalhadores
estão observando que vêm pagando um preço violentíssimo. Por isso haverá
resposta, como já está havendo na Europa, EUA, e mesmo na China, Japão e América
Latina. <BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: Então o que ocorreu com a
Irlanda é uma tendência que ainda será seguida por outros em breve?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: É claro. Itália, França... A crise está
abrindo um novo capítulo da luta de classes européia.
<BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: Como o Brasil, nas mãos de Dilma,
enfrentaria uma crise econômica, caso ela venha a bater em nossas portas, como
ocorreu em 2008? A situação ficaria mais difícil de ser contornada sem Lula, vez
que estamos diante de uma personalidade sem a mesma experiência e predicados
políticos? <BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Não sei. É difícil fazer
prognóstico. Na periferia capitalista, sempre é difícil contornar. E se for
necessário apertar os trabalhadores, não deixará de fazê-lo, como já mostrou.
<BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: O sociólogo Francisco de Oliveira,
em entrevista ao Correio, declarou que o governo petista pode ser tomado como
mais privatista que o governo FHC. Não propriamente em função das privatizações
sorrateiras através das várias Parcerias Público-Privadas efetivadas sob Lula,
mas na medida em que ele consolidou o capitalismo monopolista de Estado. O que
pensa disto e como deve caminhar o governo Dilma neste sentido?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: O que ele quer dizer com isso? Não há
nenhuma novidade. O capitalismo monopolista de Estado é uma teoria que o Chico
de Oliveira requenta. O fundamental não está aí. O Brasil é um país dependente e
periférico, subdesenvolvido. E essa é a questão. O Chico de Oliveira tem um
problema em enfrentar o tema do desenvolvimento. <BR> <BR>Ele andou muito
lá no CEBRAP (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento); portanto, ficou
contaminado por isso, e nunca aceitou o tema do subdesenvolvimento. Passa longe
do horizonte intelectual dele. Não é isso que está em questão. O Brasil deixou
de ser um capitalismo periférico, e agora é capitalismo monopolista de Estado:
qual a vantagem analítica desse enfoque? Não vejo. <BR> <BR><STRONG>Correio
da Cidadania: No caso, seria ressaltar a consolidação de parcerias entre o
governo e os principais agentes privados em setores estratégicos e rentáveis,
conformando nova modalidade de transferência de patrimônio e riquezas públicas e
sociais para mãos particulares. <BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Essa
teorização toda é uma bobagem. Qual a natureza do Estado aqui? Capitalista. Isso
até a sociologia do Octavio Ianni já havia descoberto lá atrás: é a ditadura do
grande capital. Na periferia capitalista seria diferente por quê?
<BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: Ainda assim, em linha direta de
oposição a esta constatação da linha privatista sob Lula, governo, apoiadores e
até mesmo uma parte da grande mídia – mesmo que a partir de interesses
divergentes - têm incisivo discurso sobre a ‘retomada’ do papel gerenciador e
referenciador do Estado na economia, do que o PAC seria forte evidência. O que
pensa disto? <BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Bobagem. Capitalismo não
existe sem Estado. Se ficarmos discutindo aqui que houve um período neoliberal a
ser sucedido por outro desenvolvimentista, vamos aceitar que o grande
antagonismo na sociedade brasileira é entre tucanos e petistas. <BR> <BR>Os
capitalistas sabem que quando era pra privatizar contaram com o FHC. Quando era
pra controlar e repassar a poupança nacional do BNDES pra salvar os grandes
lucros, contaram com o Lula. Não há diferença nenhuma. Se os tucanos estivessem
no poder provavelmente teriam feito tudo igual, a negociação do Antonio Ermírio,
da saúde, da Votorantim, como fez o Lula. É da natureza do Estado.
<BR> <BR>Há muito tempo a sociologia brasileira deixou de estudar o Estado.
Está mais interessada em políticas públicas. É um desastre analítico. O
resultado tem sido apenas uma tentativa do mundo universitário de buscar
acomodação nas verbas do governo, mas não tem oferecido mais lucidez analítica.
<BR> <BR>Ora, o Estado vai continuar intervindo, privatizando, colocando
essa imensa poupança nacional a serviço do fortalecimento de grupos industriais
de natureza agrícola e mineral. É um desastre deixar de fazer tais análises!
<BR><STRONG> <BR>Correio da Cidadania: Como deverá caminhar a diplomacia de
Dilma no que se refere ao relacionamento político e econômico com os demais
países da América Latina, especialmente aqueles que carregam as pautas mais
progressistas, e polêmicas, como Venezuela e Bolívia? Haverá, em sua opinião,
mudanças significativas relativamente à gestão Lula?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: Não diria que são polêmicos as pautas dos
países citados. A Venezuela tem um horizonte socialista. Não podemos reforçar
esses estigmas. Espero que o governo tenha uma linha de atuação muito mais
próxima aos países progressistas da América Latina, porque sem ela o Brasil fica
muito mais fraco. O Brasil precisa ter aliança com a esquerda latino-americana.
<BR> <BR>Em segundo lugar, é preciso avançar para além das limitações que a
nossa política externa vem sofrendo. Abandonar a política sub-imperialista, ter
uma melhor idéia de integração, atuar numa linha mais claramente
anti-Washington, sem a qual não há avanço diplomático, econômico, político e
cultural. <BR> <BR>Não é só isso. Precisamos criar uma política cultural
que varra a indústria cultural estadunidense de nossas vidas, desde a infância,
de todos nós. É necessária uma mudança radical na política cultural, que precisa
ser claramente antiimperialista. <BR> <BR>Não acredito que a presidente vá
fazer isso, mas gostaria. <BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: E também
reforçar mecanismos e instituições regionais... <BR></STRONG> <BR>Nildo
Ouriques: Precisa ver se vão se concretizar Unasul, Banco do Sul, Conselho de
Defesa... De toda forma, a Avenida Paulista vê tudo isso com muita restrição.
<BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: Quais são as perspectivas da
Esquerda? Acredita que deva ser reconstituída uma frente de esquerda?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: A esquerda no Brasil, em primeiro lugar,
tem que pensar a revolução brasileira, e o seu programa. Para isso, precisa ser
uma esquerda nacional, o que até hoje ela se recusa a ser. Uma anomalia
incrível. A esquerda russa é russa, a esquerda cubana é cubana, a chinesa é
chinesa, portanto, a esquerda brasileira precisa ser brasileira. Tem de discutir
a teoria do capitalismo aqui, discutir uma revolução brasileira, que precisa ser
nacional, além de socialista. <BR> <BR>Mas, se nossa esquerda continuar
eurocêntrica, prosseguirá isolada do povo, não dará um passo à frente. Mais do
que crer e rediscutir os atuais partidos, é preciso rever e aprofundar os
vínculos orgânicos com o povo e repensar teoricamente o programa da revolução
brasileira. <BR> <BR><STRONG>Correio da Cidadania: E quanto aos movimentos
sociais, especialmente o MST, como devem seguir no governo Dilma a seu ver?
<BR></STRONG> <BR>Nildo Ouriques: O movimento social está, digamos assim,
de crista baixa. Espero que o MST mantenha-se combativo, coloque o tema da
Reforma Agrária sempre em evidência e que não sucumba ao governismo, entenda que
o melhor que pode passar ao movimento, e a todos nós, é a manutenção da
independência. E, sobretudo, que compreenda que, se não mantiver essa autonomia,
vai, necessariamente, recuar em termos de luta política. E a direita avançará.
</DIV>
<DIV align=justify>
<HR>
</DIV></FONT></BODY></HTML>