[Laredviene] Fwd: 40anosdeMEP Enc: Muniz Sodré comenta a cobertura dos acontecimentos no RJ
Hildezia Medeiros
hildezia en gmail.com
Vie Dic 3 08:31:45 UYST 2010
*Oi, amigas:*
*Para ajudar na reflexão sobre os acontecimentos ocorridos aqui no Rio, com
a pensar as nossas cidades. *
*Beijos, *
* Hildézia
*
*RIO CONTRA O CRIME**
Reality show em tempo real*
Por *Muniz Sodré* em 30/11/2010
"A fascinante violência no Rio de Janeiro foi de novo um sucesso."
A frase final de um artigo do editor de *Destak* (sexta-feira, 26/11),
jornal carioca de distribuição gratuita nos sinais de trânsito, vale como
sintoma do que foi a cobertura jornalística (imprensa escrita e televisão)
do terrorismo delinquente nas ruas do Rio e da consequente reação das forças
policiais. Em termos de modelagem ideológico-editorial, não há diferença
entre a pequena e a grande imprensa.
Como preliminar, é preciso deixar claro que a operação policial, com o apoio
logístico da Marinha e reforço posterior do Exército e da Polícia Federal,
foi recebida com aplausos pela população, inclusive a maior parte dos
moradores do complexo de favelas invadido, todos já psicologicamente
saturados dos efeitos desgastantes do domínio dos bandos ilegalistas sobre
os cidadãos de todas as classes sociais. Na sociedade e na web: uma ligeira
vista de olhos pelas redes sociais permite localizar endereços de Facebook
com caveiras (emblema do Bope) estampadas.
Por outro lado, se nas ruas do "asfalto" o medo ronda pedestres e
motoristas, nos morros, ou "comunidades periféricas", registra-se o imenso
alívio de moradores que, além do cerceamento do direito constitucional de ir
e vir, eram ultimamente obrigados a servir comida a marginais desfalcados da
renda costumeira do tráfico de drogas, em virtude da ação das "unidades
pacificadoras".
*
Jornalismo "técnico"
*
Mas não há nada de "fascinante" nisso tudo, nem mesmo a ser "celebrado",
como frisou o secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame.
A hora é de preocupação ou de pausa para a reflexão, bem ao contrário da
espetacularização encenada pela mídia. Na verdade, é mesmo ocasião para
alguma tristeza em face do número elevado de mortos e da convicção de que a
situação a que agora se chegou é o resultado de desgovernos anteriores e da
crescente mafialização da vida pública. Este fenômeno abrange a composição
de partes significativas de câmaras legislativas, a corrupção policial, a
fragilidade do Poder Judiciário, a disseminação das milícias (potencialmente
mais perigosas do que o narcotráfico) e a escandalosa indiferença da própria
sociedade ao consumo de drogas.
A mídia é aqui também objeto de preocupação.
É verdade que foi provavelmente uma imagem veiculada pela TV Globo (dezenas
de bandidos armados e reunidos na Vila Cruzeiro, o *bunker* das ações
terroristas nas ruas) a deflagradora da invasão e ocupação do local por
tropas de elite da polícia, escudadas por veículos blindados da Marinha.
Imagens de TV – mas também o risco de arranhão na imagem internacional da
cidade que abrigará a Copa e as Olimpíadas – são claramente motivadoras da
ação. Afinal, o poder constituído sabia desde muito tempo atrás do
incremento exponencial de sua contrapartida nas favelas, o poder do
ilegalismo.
Mas a cobertura jornalística dos acontecimentos, a televisiva
principalmente, revelou o anacronismo cívico de um jornalismo puramente
"técnico", movido pelo espetáculo do fato e praticado nos moldes de uma
presumida filmagem, ao vivo, da realidade. "Globocop", nome do helicóptero
da TV Globo, é a máquina equipada com quatro tripulantes e uma câmera capaz
de girar em 360 graus e de captar imagens com precisão a um quilômetro de
distância.
*
"Como Copa do Mundo"
*
Evocativa de *Robocop*, conhecido personagem cinematográfico, a máquina
televisiva associou-se à metáfora da "máquina de guerra", usada pela mídia
para caracterizar as ações policiais. Com ela, a cobertura converteu-se numa
espécie de "*Tropa de Elite 3*", produzindo efeitos de identificação
projetiva, segundo os quais estariam entrando em ação aqueles que o
colunista Merval Pereira designou como "centenas de capitães Nascimento
encarnados em cada um dos soldados do Bope" (*O Globo*, 26/11/2010).
Como num filme ou numa telenovela, constrói-se uma polaridade (os bons
contra os maus), da qual se alimenta a narrativa midiática. O texto de *
Destak* é explícito: "Éramos *nós* atirando, acenando com bandeiras brancas
sobre lajes e nos escondendo dos tiros dentro de casa, contra *eles*, que
fugiam ou nos afrontavam. (...) A cidade se uniu diante da TV, tentando
torcer por si". Essa polaridade ("nós" contra "eles") é tão falsa quanto a
polaridade entre polícia e bandido, já que, na corrupção cotidiana, não raro
um termo equivale ao outro.
Mas a lógica do espetáculo demanda uma oposição folhetinesca. Assim, as
palavras em itálico (cena, torcida) são índices semióticos da
espetacularização, confirmada na coluna de Merval Pereira: a cobertura seria
de fato "um *reality show* em tempo real". Seria algo como um *game*,
encenação televisiva de um "show da vida" ou uma partida de futebol, capaz
de converter o cidadão em torcedor: "Uma sensação parecida com ver um jogo
de Copa do Mundo. Em vez de um time representando o país, eram policiais. Em
vez de gol, a vibração surgiu no momento em que dois traficantes em fuga a
pé foram alvejados" (*Destak*).
*
Razões da impunidade
*
Há algo de socialmente obsceno nesse transbordamento do espetáculo. É
moralmente inadmissível essa assimilação de uma tragédia urbana, com mortes
e sofrimento, a um show de TV. Nem faz justiça ao comportamento da polícia:
o Bope sentiu-se prejudicado, em plena ação, pela cobertura televisiva; o
secretário de Segurança enfatizou que "não há nada a celebrar". O
comedimento da polícia é uma crítica implícita à falta de consciência
crítica dos jornalistas.
Como poderia manifestar-se essa consciência?
Antes de tudo, no questionamento desse modelo de jornalismo, que confunde a
informação responsável do fato com a exposição obscena (em seu sentido
radical, esta palavra de origem latina significa postar-se diante da cena –
*ob-scenum* – sem as devidas mediações culturais) dos acontecimentos.
Simplesmente mostrar não é informar. Pode ser, no limite, um modo de excitar
a pulsão escopofílica do espectador.
Informar criticamente – o que se revela socialmente imprescindível no caso
em pauta – seria comunicar os acontecimentos dentro do quadro explicativo de
suas causas, aliás bastante evidentes para qualquer observador atento.
Pode-se começar com os constituintes de 1988, que legislaram em matéria
penal com a ditadura e o preso político em mente e, ao fundo, a doutrina
liberal-individualista do direito pós-Revolução Francesa. Resultou daí uma
legislação tíbia frente ao delinquente comum, com a impunidade no horizonte.
Mata-se por dá cá essa palha.
*
Comedimento e responsabilidade
*
Em seguida, seria preciso colocar em pauta a corrupção avassaladora de
governos, políticos, policiais etc. Não deixar também de indagar sobre a
responsabilidade da sociedade civil (se é que esse conceito se aplica ao
Brasil) no tocante às drogas e à mafialização generalizada, que vem pondo em
segundo plano o problema do tráfico de drogas. Finalmente, tentar jogar
alguma luz sobre as perspectivas de emprego para quem se dispõe a abandonar
o crime.
Certo, o jornalista poderá responder a tudo isso com a alegação de que o
imediato de sua condição profissional lança-o sob pressão sobre a superfície
do fato, para dar conta a seu público das ocorrências em bruto. A notícia
seria, assim, a pura e simples mercadoria de sua prática industrial. É o que
se aprende, é o que se faz – e o que dá certo em termos de audiência e
mercado publicitário.
Esse é, de fato, o modelo consagrado pelo jornalismo tal como o conhecemos e
talvez não possa ser mudado sem mais nem menos. Mas é certamente um modelo
sem amanhã cívico; portanto, algo a ser debatido e repensado.
Nesse meio tempo, seria oportuno um pouco mais de comedimento e
responsabilidade social. A morte violenta do outro não pode converter-se em
fantástico show da vida.
(fonte: Observatório da Imprensa)
Jornalista <http://pt.wikipedia.org/wiki/Jornalista>,
sociólogo<http://pt.wikipedia.org/wiki/Sociologia>e
tradutor <http://pt.wikipedia.org/wiki/Tradu%C3%A7%C3%A3o> brasileiro,
professor <http://pt.wikipedia.org/wiki/Professor> da Universidade Federal
do Rio de Janeiro<http://pt.wikipedia.org/wiki/Universidade_Federal_do_Rio_de_Janeiro>,
na Escola de Comunicação<http://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_de_Comunica%C3%A7%C3%A3o_da_UFRJ>.
Muniz Sodré Atualmente exerce o cargo de diretor da Biblioteca
Nacional<http://pt.wikipedia.org/wiki/Biblioteca_Nacional>.
É um pesquisador brasileiro e latino-americano no campo da
Comunicação<http://pt.wikipedia.org/wiki/Comunica%C3%A7%C3%A3o>e do
Jornalismo. Dirigiu a TV Educativa. Publicou quase uma centena de
livros e artigos, na área da comunicação(jornalismo em especial) mas também
livros de ficção e um romance (O bicho que chegou a feira) alguns livros o
tornaram mais conhecidos na área, como *Monopólio da Fala* (sobre o
discurso<http://pt.wikipedia.org/wiki/An%C3%A1lise_do_discurso>da
televisão <http://pt.wikipedia.org/wiki/Televis%C3%A3o>) e *Comunicação do
Grotesco* (sobre programas de TV que exploram escândalos e aberrações).
--
Movimento Rio Pró-Confecom ( Conferência Nacional de Comunicação )
Nome anterior Rio Pró Conferência Nacional de Comunicação
Informações e inscrições:
http://groups.google.com.br/group/rioproconferencia?hl=pt-BR
Site : http://www.rioproconferencia.com.br
Blog: http://rioproconferencia.blogspot.com
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Tel: (21) 2117-7828
Reunião: Uma vez ao mês, "sempre na primeira segunda-feira útil do mês".
OBS: Quando a primeira segunda-feira do mês for feriado, a reunião
será na próxima segunda-feira que não seja feriado.
Local: Clube de Engenharia (Avenida Rio Branco 124, 23ª andar).
Cidade do Rio de Janeiro
Horário: 19 horas
A reunião dos grupos de trabalho são realizadas em outros dias.
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rioproconferencia en googlegroups.com
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rioproconferencia+unsubscribe en googlegroups.com<rioproconferencia%2Bunsubscribe en googlegroups.com>
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Hildézia
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*"O filósofo é aquela pessoa preocupada com o que toca ao nosso ofício de
viver como humanos*"
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