Brasil: dineros públicos y populismo, armas electorales de Lula [Roberto Romano - entrevista en portugués]

Ernesto Herrera germain en chasque.net
Vie Feb 10 09:48:06 UYT 2006


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Boletín informativo - Red solidaria de la izquierda radical

Año III - Nº 9337 - Febrero 10 - 2006 - Redacción: germain en chasque.net

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Brasil

Entrevista a Roberto Romano

Propaganda oficial e populismo serao as armas eleitorais de Lula...

"A República precisa ser repensada"


Mateus Alves e Valéria Nader
Correio da Cidadania Nº 485, 4-2-06
http://www.correiocidadania.com.br/


O Correio da Cidadania entrevista nesta semana o filósofo e professor da Unicamp Roberto Romano, que analisa o governo Lula, a República brasileira e comenta os ganhos e perdas dos movimentos sociais sob o governo Lula.

Correio da Cidadania: Qual a sua opinião sobre o fim da verticalização nas eleições?

Roberto Romano: O fim da verticalização serviu muito para as oligarquias regionais brasileiras, para os partidos oligárquicos, que têm interesse sobretudo no trato da região com o poder central. Eles precisam da mercadoria - votos - para oferecer ao governo federal e, com isso, segurar o seu poder regional. O que aconteceu foi uma reiteração de um dos mais antigos costumes eleitorais brasileiros, os famosos currais eleitorais. É lamentável, pois isso é um retrocesso do ponto de vista da democracia.

Se analisarmos a verticalização de um ponto de vista estritamente jurídico, temos que levar em conta o fato de que o Brasil ainda não é uma República federativa completa. O poder central é demasiado, os estados estão praticamente presos a esse poder central e não têm autonomia. Se pensarmos em termos ideais, fica evidente que a verticalização foi um atentado à federação. Por outro lado, conhecendo a federação brasileira e conhecendo o poder das oligarquias, vê-se que não foi um passo adiante e nem um passo atrás. Está tudo como antes no quartel de Abrantes, o que é algo de se estranhar, sobretudo se se levarem em consideração as promessas de alteração da estrutura política do país feitas pelo partido que atualmente está no governo.

CC: E os prejudicados, quem foram?

RR: Os prejudicados são os de sempre: aqueles que são obrigados a sofrer o tacão desses oligarcas, a população em geral, a cidadania etc. Prejudicados, nos dois sentidos: se a verticalização fosse imposta, muitos partidos pequenos teriam problemas, como seria o caso do PSOL e do PV; com essa mudança, no entanto, não se pode dizer que esses partidos foram automaticamente beneficiados; o jogo está empatado. O que acontece é que há um desrespeito absoluto à cidadania. Concordo cada vez mais com Fábio Konder Comparato, que diz que o Brasil é tudo menos uma República; é muito estranho termos uma República onde o povo soberano não é ouvido.

CC: Considerando a regra constitucional de que mudanças nas regras eleitorais devem ser feitas um ano antes da data das eleições, seria possível o STF (Supremo Tribunal Federal) barrar o fim da verticalização?

RR: Tal regra existe, mas analisando a atuação recente dos ministros do STF, em especial a de Nelson Jobim, essas regras foram feitas para favorecer o governante da hora, e não a democracia e nem a população. O ministro Jobim vem dando tapas na consciência democrática e na vida nacional, mostrando claramente que é o campeão do Planalto no STF - como foi no governo de FHC, está sendo agora no governo de Lula. 

CC: Que prognósticos o senhor faria sobre o processo eleitoral nesse ano? Como deverá decorrer?

RR: Acredito que a campanha eleitoral já começou há um bom tempo, com a utilização de dinheiro público, através da propaganda oficial. É escandaloso o que o governo federal está fazendo por meio das propagandas do Banco do Brasil, de órgão ligados à saúde; estão fazendo propaganda política direta. Concordo com a opinião de Oded Grajew de se abolir a propaganda oficial - que supostamente é feita para informar a população dos problemas do país, mas se torna uma maneira marota de qualquer governante, seja ele tucano, peemedebista ou o que for, fraudar a boa-fé pública e de utilizar milhões para se promover. É o que está ocorrendo agora. 

Além da propaganda, há o reforço do ministro Jobim - que tem notórias pretensões de ser vice do presidente de República -, o que põe fim à situação de acuamento da candidatura Lula. Há um saber de trabalho político extremamente competente, o PT tem esse know-how, e, portanto, tenho quase certeza da reeleição do presidente. 

Por outro lado, os tucanos mostram-se extremamente tímidos, talvez porque tenham algo a pagar e não querem que isso venha à tona - o vergonhoso depoimento de Antonio Palocci no Senado mostrou isso. Ali vimos uma situação capaz de envergonhar qualquer cidadão e mais ainda uma oposição que se pretende ética. A coisa adquiriu proporções de escândalo quando, no dia seguinte, as verbas para o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL/BA) foram liberadas. É o famoso "é dando que se recebe". 

Portanto, no campo da oposição, não vejo nada que seja suficientemente agressivo para acabar com essa vantagem que foi dada ao presidente da República. Darei todo o meu apoio aos pequenos partidos, votarei neles, mas creio que não seja possível reverter qualquer quadro. Eles estão numa outra fase partidária, sedimentando-se no campo nacional. Em 2006, terão, evidentemente, um aumento significativo em seu número de votos.

Gostaria de ter outro prognóstico, mas vejo que teremos uma reeleição e mais quatro anos de crise política, dada essa atitude extremamente imperial do núcleo do PT e do próprio governo. 

CC: O que significará uma eventual vitória de Lula para o Brasil? 

RR: Podemos seguir para uma manutenção dessa política de extrema-direita - onde há um orgulho em pagar o FMI antes do prazo -, com alguma concessão aos movimentos sociais. Estes não exigem muito, são realistas. Nenhum deles extrapola, não vejo neles uma radicalização revolucionária. Todos possuem reivindicações no campo e nos limites da propriedade burguesa. O que o MST quer é que a propriedade seja redistribuída, não que seu princípio seja destruído. 

Há um segundo caminho. Se o governo tiver bom senso - o que é difícil de se prognosticar quando falamos do governo Lula -, uma parte desse superávit primário será destinada, em primeiro lugar, para a ciência e tecnologia. Quando tomou posse, Lula prometeu que, ao final de seu primeiro mandato, 4% do PIB (Produto Interno Bruto) seriam destinados ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Por enquanto, não houve interesse do governo nesse tipo de aplicação - o que é um equívoco criminoso em relação ao futuro do Brasil. Os Estados Unidos da América dominam o mercado com tecnologia de ponta; a União Européia tem em vista esse fator para a criação de um antagonismo em relação aos EUA; a China, o Japão e os tigres asiáticos também aplicam pesadamente em educação e em ciência e tecnologia para se tornarem competitivos. O que se vê no Brasil é o pagamento de juros com o superávit primário. O que existe de incentivo no Brasil está em São Paulo, por conta da Fapesp. Em termos federais, é quase nula essa aplicação. Daqui a alguns anos, seremos pura e simplesmente consumidores de produtos do exterior e, além disso, inadimplentes novamente.

CC: Como o senhor encara a possibilidade de reeleição em nosso país?

RR: Bom, eu tenho uma visão bastante peculiar da própria idéia de presidencialismo. Sou cada vez mais a favor do parlamentarismo, que foi liminarmente recusado pelo PT e pela esquerda porque havia a esperança de que, chegando ao governo, o partido mudaria tudo em três dias - bastava vontade política. A idéia do parlamentarismo era apresentada sumariamente como a idéia de um golpe que impedia Lula de chegar ao poder.

Fábio Konder Comparato, em artigo intitulado "Réquiem para uma Constituição" - que inclusive deveria ser distribuído nas portas das fábricas -, diz que o poder presidencial brasileiro herdou todas as prerrogativas imperiais. O Estado brasileiro foi criado de uma maneira conservadora, contra a revolução francesa e contra a revolução norte-americana. Foi criado para impedir que uma revolução acontecesse, e se montou uma estrutura que contava com um Poder Moderador. Na proposta inicial do Benjamim Constant, que era um liberal francês, ele apenas coordenaria os três poderes; aqui, no entanto, ele foi colocado acima dos outros poderes, o que fez com que o Império brasileiro fosse um dos mais autoritários de seu período. 

Quando foi criada a República, ao invés de se abolir o Poder Moderador, este foi incorporado à presidência. O presidente é um imperador por quatro anos, e daí vem a fonte das crises de todos os governos: com poderes ilimitados, os presidentes nomeiam os ministros do STF, os procuradores da República, os procuradores gerais. As eleições são sempre plebiscitos imperiais: o presidente sobe com o nariz empinado - pelo menos desde Jânio Quadros é assim - e, muitas vezes, sai morto ou deposto, ou renuncia frente a uma crise tremenda. 

Essa República imperial precisa ser repensada. É preciso retirar, por exemplo, esse poder do presidente de nomear ministros do STF, que passam a dever um favor a ele, e que o pagam com votos sobre o nosso direito. Veja os planos econômicos realizados até hoje, verdadeiros golpes de Estado. Até hoje o STF não se manifestou sobre o Plano Collor, que foi um confisco. 

O presidente é todo-poderoso para manipular a instituição do Estado, mas depende das bases parlamentares, o que resulta em mensalão e em outras corrupções. E falam do mensalão como se fosse o único escândalo, mas a super-concentração dos impostos e a não distribuição desses recursos para o município e regiões são igualmente escandalosas. Quando se vai votar uma lei e alguém diz "olha, para os recursos chegarem a Ribeirão Preto, você vai ter que votar a favor do governo", é muito pior que o mensalão. Acabar com essas prerrogativas que vêm desde a independência do Brasil não é fácil; sempre há a esperança em todos os partidos de que, quando chegarem à presidência, isso vai mudar. Até a esquerda participa dessa ilusão.

Há também o fato de o Brasil ser um país continental. Esse problema das finanças tem inclusive atormentado a União Européia, que é um conjunto de países fortíssimos. Em qualquer debate jurídico sobre a questão naquele continente, é apresentada essa questão dos impostos. Países como a França e a Holanda tiveram medo em relação ao que iria acontecer com a distribuição dos impostos, de que grande parte dos recursos fosse destinada aos países que pertenceram à União Soviética. Nos Estados Unidos, isso também é problemático, os estados não aceitam uma super-centralização no governo de Washington. Aqui, nem o debate nós temos; ele foi levantado nos anos 50 e 60 pelos municipalistas e perdeu fôlego. Continuou o espetáculo dos prefeitos com o pires na mão, assediando o poder central. Quando se coloca qualquer discussão mais séria sobre os impostos, acontece uma guerra fiscal, como pudemos observar nessa tentativa fracassada de realizar uma reforma durante o governo Lula.

CC: Além destas que o senhor acabou de anunciar, qual a conjuntura e medidas necessárias a uma mudança qualitativa em nosso desenvolvimento? Em outras palavras, há alternativas ao neoliberalismo neste momento? Qual o caminho a trilhar?

RR: Há uma receita muito antiga, todo país que progrediu a utilizou. Estou estudando a democracia ateniense sob Sólon. Qual foi a grande novidade que ele instalou? Em primeiro lugar, a interrupção das dívidas dos camponeses, que não mais precisavam pagar a taxa de ocupação do solo para os grandes latifundiários, realizando uma distribuição das terras de maneira mais adequada. Quando os EUA invadiram o Japão, a primeira medida que lá aplicaram foi a reforma agrária. Vê-se que todos os países que conseguiram dar um salto industrial pelo menos equacionaram - não perfeitamente, pois nada de perfeito existe no mundo dos homens - o problema agrário. Esse é o primeiro passo que temos que dar no Brasil. É preciso decidir o peso de cada setor; por exemplo, é preciso pensar um espaço para o agronegócio, mas é preciso garantir a divisão fundiária e a equação agrária. Eu não esperava que Lula fizesse a reforma agrária do século, mas que estabelecesse uma estratégia e uma tática para essa resolução. Não fez nada, apenas a política tradicional dos assentamentos, sem nenhuma providência mais profunda em termos de suporte técnico, educacional etc.

Em segundo lugar, temos a já mencionada aplicação de recursos em ciência e tecnologia. O operário brasileiro não tem o mesmo acesso ao setor quando comparado ao operário norte-americano, europeu ou asiático. As últimas medidas que tivemos no país ainda se resumem aos "S", Senac, Senai etc. Depois disso, mais nada; foi dos "S" que surgiu a potência de São Bernardo do Campo, e não temos um equivalente contemporâneo. O que o Brasil vive hoje é a promoção dessas zonas como Manaus, onde a mercadoria chega pronta, coloca-se um selo e se paga o imposto. Isso nutre a preguiça do poder federal, qualquer que seja o partido que lá esteja.

Terceiro, como também já disse, é necessária uma política concertada de elaboração e distribuição dos impostos. O Brasil é um país onde os impostos são excessivamente concentrados no poder central, e, para que esses impostos cheguem aos municípios, se estabelecem os chamados intermediários. Existem muitos Marcos Valérios operando em silêncio, e sabemos que são verdadeiros ralos que impedem que os recursos alcancem os seus destinos. Os deputados que fazem esses dutos, os senadores, pervertem a cidadania local. Para o cidadão, bom deputado, bom senador, é aquele que traz obras para a região. No entanto, nunca perguntam - e a imprensa não esclarece, nem os partidos indicam - o que os políticos estão fazendo para conseguir tais obras. Como conseguem participação orçamentária? Vendendo-se para o Poder Executivo. Isso é uma fonte de corrupção e uma fonte de perversão do próprio cidadão, que, ao invés de exigir que os recursos venham de uma forma transparente para o seu município, de forma permanente e não esporádica, continua apoiando esses políticos. Veja o caso de ACM: mesmo os seus inimigos o apóiam na Bahia, pois ele traz recursos do governo federal seja do jeito que for - e sabemos como ele os consegue, vide o depoimento de Palocci. 

Essas medidas implicam em alicerçar a República, a Federação, os municípios, e estabelecer um plano realista de abordagem dos problemas sociais. É mais ou menos isso o que penso em termos de programa mínimo, mas evidentemente isso pressupõe uma política bem diferente da atual.

CC: O que é e quem é, a seu ver, a esquerda hoje no país? Como tem sido a sua atuação? Ou, alternativamente, como deveria mobilizar-se?

RR: Ela existe no interior de vários partidos, mesmo no PSDB, no PT, ainda existem pessoas de esquerda. Há também a esquerda mais organizada, como o PSOL e o PSTU. Para mim, o PCdoB já não é mais de esquerda, pois perdi o parâmetro para analisar o partido. Conheço militantes valorosos e tenho muito respeito por eles, mas o realismo do PCdoB está se manifestando de uma maneira muito estranha. Estão escapando às suas matrizes ideológicas e históricas, e hoje cumprem o papel de um partido tradicional brasileiro.

O lingüista Jean Pierre Faye, em seu livro "A Teoria do Relato", analisa a circulação das noções entre a esquerda e a direita. Num sistema que criou e ao qual deu o nome de "ferradura ideológica", ele diz que, dados os interesses múltiplos e momentâneos, que não são de ordem estratégica nem de ordem tática, muitas vezes uma palavra de ordem que surge na extrema esquerda circula pelo aspecto ideológico e termina na extrema direita. Nunca se pode ter certeza de que se está usando uma palavra que é genuinamente, apenas e tão somente de esquerda ou de direita. Faye cita, por exemplo, o caso da colaboração entre o stalinismo e a Alemanha nazista; nesta última, ocorreu uma palavra de ordem pelo nacional-bolchevismo. Ali, a esquerda deu a sua contribuição e a direita deu a sua. Os termos nunca são impolutos, genuínos, nem sempre vão permanecer como são.

É necessário, portanto, tomar muito cuidado com a linguagem. Às vezes, uma pessoa de esquerda pode estar usando uma linguagem de esquerda cujos termos não estão mais ligados a uma política de esquerda, e sim de direita. Boa parte dos discursos atualmente veiculados em louvor do progresso econômico brasileiro é de direita e é enunciada como se fosse de esquerda. Sempre digo isso porque, em filosofia e nas análises políticas, tomamos mais cuidados não apenas com o termo, mas também com as suas conexões lógicas. 

Se alguém diz "acho maravilhoso pagar o FMI e criar um grande superávit primário, porque é a única solução para o país", para depois resolver os problemas estruturais e, ainda depois, os sociais, está dizendo a mesma coisa que foi dita na época da ditadura. É a teoria do bolo de Delfim Netto. Esse bolo foi comido pelas elites, empanturraram-se tanto que a economia brasileira foi à breca. Hoje acho fantástico Netto dar lições de realismo, enquanto deveria ficar quieto. Quando foi ministro da Economia causou, inclusive, a queda do regime militar.

Pessoas que criticavam fortemente essa teoria durante o regime militar hoje falam não mais sobre o bolo, mas sobre a mesma idéia, não importa que nome se dê a ela. Essa idéia de que você precisa primeiro satisfazer os interesses do grande capital, deixando de lado a indústria, a agricultura e a população, é uma idéia de direita, mas que pode ser expressa em termos de esquerda. 

A esquerda, como eu a conheci nos anos 60 e nos anos 70, se modificou muito. Hoje, os partidos de esquerda com coerência entre o ideário e a prática - o que não quer dizer que eu os aprove totalmente - são poucos. Há o PSOL, o PSTU, alguns setores da esquerda do PT e mesmo alguns do PSDB, que tentam impulsionar a candidatura de José Serra. Aliás, é muito interessante o juízo dos industriais paulistas sobre o Serra, que acreditam que o seu passado de esquerda e o seu desenvolvimentismo são inconvenientes para o capital. Isso é muito revelador em relação à consciência das classes dominantes brasileiras, que preferem perder os anéis a perder os dedos. 

CC: Qual é o seu olhar sobre os movimentos sociais no governo Lula? Houve uma melhora no padrão de relacionamento com estes movimentos no atual mandato relativamente ao anterior?

RR: Sempre costumo falar não dos movimentos sociais como um todo, mas sim individualmente. No caso do movimento negro, houve avanços importantes, que inclusive contaram com a ajuda do governo Lula. O debate sobre as cotas foi muito saudável e ajudou muito.

Para o movimento dos sem terra, houve ganhos e perdas pesadas. O próprio fato de se esperar do governo uma colaboração maior levou a um certo desarrazoado, a um crédito dado em demasia ao governo - o que atrapalhou a estratégia do movimento. Pode-se dizer então que houve um empate, não houve um ganho fantástico e nem uma perda absoluta.

O problema do MST não está ligado ao governo, mas sim à estrutura social. No caso do movimento negro, as leis que passam não afetam a estrutura fundiária do país; nenhum latifundiário ficará ofendido porque uma universidade tem mais negros. No caso dos sem terra, isso é muito mais virulento, e as mudanças que reivindicam afetam a sociedade brasileira.

No caso dos outros movimentos, como o movimento gay, também não vejo muitos ganhos. Os movimentos continuam desprotegidos; por exemplo, o maior número de assassinatos de homossexuais na América do Sul ocorre no Brasil. Não há garantias necessárias para os militantes e nada indica que esse modus operandi irá mudar. 

Chegamos então num ponto em que todos os movimentos minoritários têm um limite de atuação, que é a polícia; ela é preconceituosa, mal paga, incompetente e faz de conta que não viu coisas. Isso é o ponto que me parece mais delicado de todo o sistema. Veja o caso do movimento sem-teto: o que faz a polícia? Faz a sua função puramente institucional, vai lá, bate e tira. E o que faz o governo para solucionar o problema das moradias populares? Aí encontramos outro abismo, o das empreiteiras que desgraçam esse país desde a época de Juscelino Kubitschek. 

Os movimentos, em 2006, devem fazer um balanço para constatar o que perderam e o que ganharam nesses quatro anos de governo Lula. No entanto, eu acho que todos os movimentos foram grandes perdedores, na medida em que recursos ponderáveis deixaram de ser encaminhados para o implemento de seus trabalhos. Pagou-se o FMI à custa de se retirar dinheiro de todos os programas sociais. Foi uma amputação gravíssima do organismo partidário petista, pois o PT era o único partido que oferecia duas pernas de sustentação em sua organização: tinha visão de Estado e uma base de movimentos sociais. Esses dois itens foram os que criaram a sua grande força. Outros partidos menores não tinham condição de fazer tal circulação; o PSTU, por exemplo, antes de toda essa confusão, tinha uma visão mais política.

Com essa política econômica, a base de sustentação social do PT sofreu forte abalo. Quando você não irriga com sangue os movimentos, eles morrem - como diz Hobbes, na República, o dinheiro é o sangue que faz com que todas as partes vivam. Por mais que medidas corretas do ponto de vista legal, como as cotas, tenham sido tomadas, elas não correspondem à injeção de recursos. Daí decorre a situação atual, em que o PT precisa conquistar novamente o apoio que perdeu devido à política econômica. E é aí que ele está armando - e isso me parece gravíssimo do ponto de vista ético - uma propaganda que não é mais de esquerda, e sim demagógica e populista. 
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