Re: [Gcap-mujeres] En:Lamento pela Nicarágua: "el violador" volta ao poder. Fátima Oliveira (Portal Mhário Lincoln do Brasil)
Luisa Cruz Hefti
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Luisa Cruz Hefti
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Sent: Tuesday, November 07, 2006 4:26 PM
Subject: [Gcap-mujeres] En:Lamento pela Nicarágua: "el violador" volta ao
poder. Fátima Oliveira (Portal Mhário Lincoln do Brasil)
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07/11/06
Convidada para opinar sobre POLÍTICA INTERNACIONAL:
Fátima Oliveira.
Lamento pela Nicarágua: "el violador" volta ao poder
Como Carlos Drummond de Andrade, em "Hoje não escrevo", estou entediada
e incrédula diante das últimas notícias. Assunto é o que não falta, mas
"falta apetite para os milhares de assuntos". Tenho de escrever.
Começarei pelo pior: a Nicarágua ungiu, pela 3ª. vez, presidente da
República, o comandante sandinista Daniel Ortega Saavedra - que presidiu
a Nicarágua de 1979 a 1990.
Ortega, cultuado pelas esquerdas do mundo, cuja "última graça", conforme
a feminista mexicana Teresita De Barbieri, "foi apoiar a penalização do
aborto terapêutico" - um direito constitucional há mais de um século
que, em 26 de outubro passado, foi criminalizado, com 100% dos votos de
parlamentares sandinistas. Os parlamentares não definiram a pena para o
"crime por aborto", cuja proposta era mais de 30 anos de prisão a pena
para quem fizer abortos, contra a pena atual 6 anos de prisão para as
mulheres e médicos.
A lei aguarda sanção ou veto presidencial. Há uma pressão de feministas
e democratas de todo o mundo pelo veto, pois ela é a proibição completa
do aborto quando três ou mais médicos determinassem que a vida da mulher
corria risco ou quando a gravidez fosse resultante de estupro ou
incesto, permitido na Nicarágua desde 1893 (artigo 165 do Código Penal).
Então, o debate sobre o aborto foi um dos pontos mais acirrados e
polêmicos na campanha eleitoral 2006, impulsionado pela "Marcha pela
Vida", em 6 de outubro, organizada por altos dignatários da Igreja
Católica e de muitas evangélicas. O movimento feminista reagiu de forma
contundente também, visando impedir retrocessos.
arquivo
Contra a vida das mulheres
A "Marcha pela Vida" foi o pretexto que alavancou o envio, pelo
presidente Enrique Bolaños, em 16 de outubro, de proposta de extinção do
permissivo legal do aborto terapêutico à Assembléia Nacional com
recomendação de apreciação e votação em regime de urgência urgentíssima.
Aconteceu conforme o desejo presidencial, pois sua proposta de
eliminação do aborto terapêutico foi aprovada em 26 de outubro.
Conforme matéria da BBC, de 27/10/06, "Lei aprovada na Nicarágua proíbe
todo tipo de aborto", para as feministas, "a aprovação da lei seria uma
'pena de morte' para as 400 mulheres que sofrem de gravidez ectópica
(quando o desenvolvimento do óvulo se faz na trompa de Falópio) a cada
ano no país." Embora a estimativa seja que 85% da população é católica e
apóie a proibição total do aborto, "Associações médicas e representantes
da Organização das Nações Unidas (ONU) também manifestaram preocupação e
alertaram que o debate sobre o assunto foi politizado devido à
proximidade das eleições."
A penúltima do comandante sandinista? Se converteu ao catolicismo e
manifesta oposição titânica ao aborto, em qualquer circunstância. E como
neocatólico recebeu apoio financeiro e político do Vaticano, como
demonstram as ações do cardeal Mighel Obando y Bravo - que pediu o voto
dos católicos e compareceu aos atos de campanha de Ortega, em nome de
Deus, para legislar sobre os corpos das mulheres.
Ortega ainda tenta transformar a sua vítima em ré
A primeira malfeitoria de Ortega? É um crime hediondo. Estuprou, e
continua impune, a filha de sua atual mulher, e sua filha adotiva, a
socióloga Zoilamérica Narváez - hoje com 39 anos e mãe de dois filhos.
Zoilamérica diz ter sido violentada por Ortega dos 11 anos até seu
casamento, em 5/10/1990, com Alejandro Bendana. Ortega assediou-a dos 11
aos 14 anos; estuprou-a aos 15; e ministrou-lhe, pessoalmente, doses
maciças de tranqüilizantes durante anos a fio. A Justiça nicaraguense
arquivou duas vezes as denúncias da vítima. Em outubro de 1999 o Centro
Nicaraguense de Direitos Humanos, com a anuência dela, encaminhou a
denúncia à Corte Interamericana de Direitos Humanos (OEA).
O lamento é que equivocadamente, em nome da luta anti-imperialista, seja
eleito Presidente da República da Nicarágua, com as bençãos descaradas
do Vaticano, um estuprador de mulheres reconhecido como tal pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos que condenou o Estado da Nicarágua
por retardamento e obstrução da Justiça e instou ao presidente Enrique
Bolaños a ressarcir financeiramente os danos por ela sofridos e a pedir
perdão em nome do Governo de Nicarágua. Punições não cumpridas até hoje.
Segundo Zoilamérica: "Ortega disse que eu poderia satisfazer minhas
necessidades de vida pública com alguém e ter uma vida de casada e
filhos, mas sentenciou que eu lhe pertencia e seu vínculo comigo era
indissolúvel". Ele telefonava diariamente exigindo que ela descrevesse
as relações sexuais com o marido.
"A freqüência, a persistência e a obsessão patente nestes telefonemas me
afetaram muito. Suas insinuações sexuais eram totalmente pervertidas e
me ofendiam muito. Ele insistia na proposta de relações sexuais a três:
ele, eu e Alejandro. Dizia que não participaria ativamente, apenas nos
observaria. Também sugeriu que eu filmasse minhas relações sexuais com
meu marido para que eu e ele, Ortega, assistíssemos juntos". (pág 33 do
Testemonio de Zoilamérica Narváez contra su padastro Daniel Ortega
Saavedra).
Se nem o casamento a protegia de Ortega, a saída para assenhorar-se de
sua vida seria falar. E ela falou: Testemonio de Zoilamérica Narváez
contra su padastro Daniel Ortega Saavedra (1998). .
Vozes e temores de feministas na Nicarágua
Em 31 de outubro passado Zoilamérica, atualmente evangélica, numa
coletiva de imprensa, organizada pela Rede de Mulheres Contra a
Violência, informou que, 9 anos após denunciado, Ortega jamais pediu
perdão, não reconheceu seus atos cruéis e continua em liberdade -
acobertado pela Justiça nicaragüense e pelos partidos políticos.(...)
Para ela, "Ainda que abençoados pelas cúpulas religiosas, os
estupradores de mulheres nem por isso serão perdoados por Deus" e que
"Não pode haver reconciliação sem arrependimento e sem pedir perdão.
Daniel Ortega tem de reconhecer o que fez comigo e ficar cara a cara com
a Justiça. O perdão não deve ser uma condição para encobrir delitos
cometidos contra as mulheres. A Frente Sandinista está atuando como
salvadora de criminosos sexuais".
Diante do contexto, as feministas votaram massivamente no MRS (Movimento
Renovador Sandinista), que assumiu a defesa dos direitos humanos das
mulheres, incluindo o abortamento terapêutico.
Ouvimos uma sandinista, feminista histórica da Nicarágua, cujo nome
omitimos por questões de segurança. Eis a entrevista, feita por e-mail
em 05.11.2006:
1. Decisão da OEA: o Estado da Nicarágua cumpriu?
El Estado de Nicaragua fue condenado por la OEA por retardación de
justicia y solicitó al Presidente Enrique Bolaños resarcir
económicamente a Zoilamerica y pedir perdón en nombre del Gobierno de
Nicaragua, pero no cumplio.
2. Como está e como vive Zoilamérica?
Ella esta casada nuevamente, tuvo un niño hace unos dos años, es
integrante de una eglesia evangélica y trabaja por el tema del perdon,
especialmente a su madre. El 31 de octubre 2006, como parte del
Monitoreo de los candidatos de la Red de Mujeres Contra la Violencia,
Zoilamérica participó de una conferencia de prensa donde nuevamente
denunció que luego de 9 años, Ortega nunca pidió perdón, ni reconoció la
violación y está en libertad por la impunidad y la complicidad del
sistema judicial.
3. O que pensam feministas nicaraguenses?
Nosotras votamos masivamente por el MRS, Movimiento Renovador Sandinista
que enarboló la bandera de la defensa de los derechos humanos de las
mujeres y explicitamente del aborto terapéutico. Hemos denunciado la
oportunista "conversion al catolicismo" de la pareja Rosario Ortega
Murillo (madre de Zoilamérica) y el pacto con la jeraquia de la Iglesia
católica, cuyo cardenal Mighel Obando y Bravo llamo a votar por Ortega y
participó en cuanto acto proselitista pudo. Se conoce que a cambio
recibio muchisimo dinero y la garantia de financiamiento para la UNICA,
Universidad Catolica que ha sido transferida a patrimonio personal del
cardenal y su familia. Otro sector de la iglesia catolica llamó a votar
por el candidado fundamentalista de la derecha catolica Eduardo
Montealegre al que le organizó una "marcha por al vida", con claros
fines electorales, de la cual derivo la eliminacion del aborto terapéutico.
Como feministas hemos denunciado a todos los patriarcas porque mas alla
del aborto terapéutico y la violencia sexual, el pais ha caido en manos
de un sector que no defiende los derechos humanos, que se fortalece por
la impunidad derivada de su control del sistem judicial y de las
principales instituciones, como el propio Consejo Supremo Electoral, que
ha manipulado todo el proceso desde el mismo inicio de las elecciones.
Las libertades democráticas están amenzadas en tanto el FSLN ha pactado
con el presidente mas corrupto que hubo en Nicaragua Arnoldo Aleman, y
gracias a ese pacto el porcentaje para ser presidente paso del 45% al
35%. A cambio Ortega la garantizó a Aleman su libertad total, aunque
tiene 20 años de conderna por corrupcion y lavado de dinero, anda por
todo el pais haciendo politica al amparo del sistema judicial que manjea
Ortega. En este pacto Nicaragua ha perdido, las mujeres de Nicaragua
hemos perdido.
Zoilamérica dijo que no se iria del pais, todas nosotras pensamos que
tenemos que resistir cualquier ataque, porque las ONG's en que
trabajamos van a estar en la mira del orteguismo y la relacion con las
instituciones del Estado va a estar mediada por el clientelismo politico
y el sectarismo, seguramente habra un gran despido de tecnicos y
funcionarios publicos (que tampoco podemos defender por su ineficiencia).
El control total por parte de Rosario Ortega Murillo y la oferta de los
3 Ministerios (Educación, Familia y Salud) a sus aliados de la derecha
catolica, son lo mas negativo de lo que se nos avecina.
La confusion Estado-partido y la revancha contra quienes venimos del
sandinismo pero hemos votado por el MRS, son un elemento que los
empujará a la venganza a todo nivel, lo que causa mucho temor.
La posibilidad de conflictos internacionales y el alineamiento de Ortega
con Chavez, Kadafy y cualquier guerrerista, bajo un supuesto
antiimperialismo, seran otro punto de conflicto que no debemos descartar.
Fragmentos do testemunho de Zoilamérica à OEA
"Juro que o conteúdo deste testemunho é a VERDADE E NADA MAIS QUE A
VERDADE. Nele encontrarão as evidências de uma vida cerceada e a
depravação de um homem que foi protagonista de uma revolução social e
política, presidente da República e atual líder do principal partido de
oposição.
Quem sou? Meu nome é Zoilamérica. Meus pais são: Jorge Narvanéz Parajón
(falecido) e Rosário Ortega Murillo Zambrano. Publicamente sou conhecida
como Zoilamérica Ortega Murillo, pois fui adotada, em 1986, pelo Sr.
Daniel Ortega Saavedra.
Nasci em 13 de novembro de 1967, na cidade de Manágua; de profissão
socióloga (1995, Universidade Centroamericana, Nicarágua); militante da
Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN); e atualmente diretora
executiva do Centro de Estudos Internacionais.
Afirmo que fui assediada sexualmente por Daniel Ortega Saavedra desde a
idade de 11 anos, mantendo-se estas ações por quase 20 anos de minha
vida; abusou de minha condição de menina, de mulher, de minhas emoções e
concepções e de minha condição de militante sandinista; fui submetida,
em minha própria casa, a um regime de cativeiro, perseguição e
espionagem com a finalidade de dilacerar meu corpo e minha integridade
moral e psíquica; meus primeiros problemas de saúde foram náuseas e
vômitos sem explicações, que com o tempo foram se complicando em severas
crises nervosas, fortes dores de cabeça, asfixia; as diversas crises
nervosas tornaram-me muito frágil e vulnerável; Ortega, com seu poder,
aparatos de segurança e todos os recursos disponíveis se apoderou,
durante décadas, de uma vítima que se submetia aos seus desejos. Ele
destruiu a minha vida.
Em 1986, tendo 19 anos, dos quais 8 eram de abusos contra mim, fui
adotada como filha de Daniel Ortega com o consentimento de minha mãe.
Dias depois ele disse que a minha adoção deveria significar um vínculo
parecido com o matrimônio - um enlace, uma forma de casamento. Eu levava
o seu nome não por ser sua filha, mas por ser o seu objeto sexual.
A partir de minha incorporação política Daniel Ortega vincula seus atos
contra mim ao contexto político do país e da Revolução Sandinista.
Dizia, incessantemente, que eu contribuía para a sua estabilidade
emocional diante de uma suposta frigidez de minha mãe. Desqualificava
sua companheira de vida, distorcendo sua imagem para mim. Sua chantagem
causava-me, lastimosamente, um sentido de obrigação moral; dizia que
estava mal emocionalmente e que não podia trabalhar; chantageava-me
afirmando que qualquer decisão minha afetava a sua pessoa e à Revolução,
pois somente eu lhe dava tranqüilidade de espírito para que cumprisse
melhor os altos deveres para os quais lhe predestinou a história; deu
interpretações místicas ao que eu estava vivendo. Dizia que a vida havia
me conduzido até ele, depois de tantos anos de luta, como uma espécie de
prêmio e que essas condições difíceis eram parte do meu destino.
Em abril de 1989, com uma bolsa da Universidade Centroamericana, fui
estudar inglês em Londres, durante três meses. Daniel Ortega telefonava
duas vezes ao dia - o que era muito notório, como um amor paternal
extremado, para a família inglesa que me hospedava. Ele organizou uma
viagem para a Inglaterra. Visitou-me onde eu estava hospedada e com
pretextos bem montados pode abusar sexualmente de mim.
Minha participação política foi extremamente limitada por suas
investidas sexuais sobre mim. Quando tentava colaborar mais
decisivamente com o Fórum de São Paulo**, Daniel Ortega mandava me
chamar à sala onde ocorria a reunião na qual ele estivesse, então optei
por retirar-me. Recordo que uma vez, em uma reunião em seu escritório
com uma delegação estrangeira, durante no Fórum de São Paulo, e
confiando que todos ali estavam em seu respaldo, ele, que estava no
banheiro, começou a fazer sinais obscenos para mim e a se masturbar."
O patriarcado, as sobreviventes da violência e o poder político
Vários estudos comprovam que o "lar doce lar" é o lugar mais perigoso
para meninas, adolescentes e mulheres - as vítimas de crimes de natureza
sexual em geral cometidos por pessoas que privam da confiança delas.
Isto é, os criminosos sexuais em geral são homens da família ou aqueles
que mantém amizade, acima de qualquer suspeita, com a vítima e/ou sua
família. Considerando o exposto, a luta contra a violação e pela
proteção do direito de crianças, adolescentes e mulheres a uma vida
livre de todas as formas de violência precisa se manter viva. Devemos
ser 100% intolerantes, denunciando e exigindo punição para os crimes que
usurpam a infância, a dignidade e a auto-estima.
Todavia, tem sido corriqueiro que partidos políticos, até os tipificados
ideologicamente como socialistas, comunistas, de modo geral os "de
esquerda", no cotidiano de suas práticas políticas não têm dado a
atenção devida ao assédio e ao abuso sexual quando praticados por seus
membros, o que demonstra que o patriarcado se mantém firme e inabalável
em todos os recantos da sociedade.
A realidade cruel é que os corpos das mulheres, a vida das sobreviventes
de violência e o direito das mulheres a uma vida sem violência e à
atenção integral à saúde são moedas de troca em nome de "interesses
maiores". E o caso Ortega é exemplar.
Aprendemos que "a guerra contra Somoza foi também a luta pela libertação
da mulher", mas o comandante sandinista assediou, estuprou e manteve
relações sexuais com sua filha, contra a vontade dela, durante a
infância, a adolescência e a juventude, por quase 20 anos, no recesso do
seu lar. E tudo indica que contou com a cumplicidade e o silêncio da mãe
de sua vítima, também sua mulher, não se sabe a que preço.
Há testemunhas: uma empregada doméstica dos Ortega, Glória Romero, a
partir de 1980; e uma tia de Zoilamérica, Violeta - que em conversas com
ela disse que viu Ortega tocar em seus órgãos genitais e colocar o pênis
em sua boca. Violeta também comentou que em uma ocasião discutiu a
situação com a mãe de Zoilamérica e como resposta recebeu ameaças e
pressões para silenciar. Em nome da Revolução Sandinista! (págs. 6 e 7,
do Testemonio de Zoilamérica Narváez contra su padastro Daniel Ortega
Saavedra).
A mãe, que soube do que se passava, provavelmente ainda na infância de
Zoilamérica, nas eleições presidenciais de 2001, quando Ortega foi
candidato, disse na TV que sua filha queria tomar o seu marido e, como
não conseguiu o acusava de violentá-la! Todavia Zoilamérica relata, em
seu testemunho à OEA, que "Escutei a minha mãe discutir violentamente
com Daniel Ortega e dizia: 'Eu já sei o que está se passando... És um
doente!' De nada valeu esta discussão, pois no dia seguinte a violência
sexual voltou acontecer, como se não tivesse sucedido nada. Não sei se
chegaram a algum acordo e se ele se comprometeu a não mais abusar
sexualmente de mim. Mas se chegaram, evidentemente ele não cumpriu a
palavra." (pág. 11 do Testemonio de Zoilamérica Narváez contra su
padastro Daniel Ortega Saavedra).
Ortega continua impune. Usou e abusou do seu prestígio político; se
valeu da cumplicidade reinante em uma sociedade patriarcal, da
complacência de políticos da direita e da esquerda, bem como do aparato
de um Estado machista para desacreditar a sua vítima; e ousou
transformá-la em ré, acusado-a de seduzi-lo sexualmente e de ser contra
o sandinismo!
Agora o comandante-estuprador conta com as bênçãos das mais altas
autoridades eclesiásticas católicas da Nicarágua, a mando do Vaticano
que, não contente em acobertar padres pedófilos e violadores de mulheres
durante séculos, asperge água benta e coloca debaixo da batina Daniel
Ortega - um criminoso sexual reconhecido pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos (OEA).
Eis o fundamentalismo em toda a sua pujança: vale tudo sob o argumento
da proteção da vida dos não-nascidos, em detrimento da vida plena das
mulheres. Até desacreditar e desdenhar publicamente de uma sobrevivente
de violência sexual - estuprada e mantida em cativeiro por quase duas
décadas pelo presidente de um país - sob a inspiração (do Divino
Espírito Santo?) da dupla moral sexual vigente no oficialato da Igreja
Católica Apostólica Romana, a partir da institucionalização do celibato
e da castidade, desde então desrespeitada por parte expressiva de seus
integrantes: padres gays e freiras lésbicas, ou que exercem a
sexualidade de modo "hetero", assim como por padres pedófilos e
estupradores de mulheres, leigas e religiosas.
E essa gente, assim como expressivos setores da esquerda clássica
mundial, ainda quer que nós, as feministas, silenciemos, argumentando
que a "luta política maior", contra o imperialismo e o neoliberalismo,
exige que assim seja? Que estamos fazendo o jogo do fundamentalista
Bush, ao reavivar as denúncias contra Daniel Ortega e dizer ao mundo
exatamente o que ele é? É um engodo.
O feminismo mundial é contra Bush e abomina o fundamentalismo religioso,
oriundo de qualquer canto. O cotidiano de nossa prática política
feminista é soberbo em comprovar o que somos e o que fazemos. E na ética
feminista não há espaços para o contrário. Hoje sabemos que não é
possível um mundo de justiça e de eqüidade quando as mulheres não
dispõem de autonomia sobre seus corpos e não podem exercer a sua
sexualidade em liberdade e de forma prazerosa. E disso não abrimos mão.
Voltando a Drummond, "O que você perde em viver, escrevinhando sobre a
vida. Não apenas o sol, mas tudo que ele ilumina. Tudo que se faz sem
você, porque com você não é possível contar. Você esperando que os
outros vivam para depois comentá-los com a maior cara-de-pau ('com
isenção de largo espectro', como diria a bula, se seus escritos fossem
produtos medicinais). Selecionando os retalhos de vida dos outros, para
objeto de sua divagação descompromissada. Sereno. Superior. Divino. Sim,
como se fosse deus, rei proprietário do universo, que escolhe para o seu
jantar de notícias um terremoto, uma revolução, um adultério grego - às
vezes nem isso, porque no painel imenso você escolhe só um besouro em
campanha para verrumar a madeira."
* Médica, integrante do Conselho Consultivo da RSMLAC/Rede de Saúde das
Mulheres Latino-americanas e do Caribe, do Conselho Diretor da
CCR/Comissão de Cidadania e Reprodução, ex-secretária-executiva da Rede
Feminista de Saúde (2002-2006); autora de Engenharia genética: o sétimo
dia da criação (Moderna, 1995; 14ª. impressão, atualizada em 2004);
Bioética: uma face da cidadania (Moderna, 1997; 8ª. impressão
atualizada, 2004); Oficinas Mulher Negra e Saúde (Mazza Edições, 1998);
Transgênicos: o direito de saber e a liberdade de escolher (Mazza
Edições, 2000); ensaio "O estado da arte da Reprodução Humana Assistida
em 2002" e "Clonagem e manipulação genética humana: mitos, realidade,
perspectivas e delírios" (CNDM/MJ, 2002); "Saúde da população Negra",
Brasil 2001 (OMS-OPAS, 2002) e do romance A hora do Angelus (Mazza
Edições, 2005); articulista da página de Opinião de O Tempo (Belo
Horizonte), desde 2002.
** O Fórum de São Paulo é uma organização pluripartidária
latino-americana, cujo nome decorre de sua primeira reunião ter se
realizado na cidade de São Paulo, em 4 de julho de 1990, por 48 partidos
e movimentos sociais, para discutir os rumos da esquerda após a queda
dos regimes socialistas do leste europeu, e formular alternativas ao
neoliberalismo.
FONTES:
1. Testemonio de Zoilamérica Narváez contra su padastro Daniel Ortega
Saavedra (1998);
2. OLIVEIRA, Fátima. O feminismo resiste e luta! O TEMPO, BH, MG, 11 de
dezembro de 2002;
3. OLIVEIRA, Fátima. Solidária com Zoilamérica. O TEMPO, BH, MG, 18 de
dezembro de 2002;
4. 12º. Fórum de São Paulo: integração a partir da ótica social. DIÁRIO
VERMELHO, 02 de julho de 2005 ;
5. Lei aprovada na Nicarágua proíbe todo tipo de aborto, BBC, 27 de
outubro de 2006; e
6. SIRIAS, Tania. Con testimonios de Zoilamérica y Francis Bustos Red de
Mujeres denuncia a Ortega y a Talavera. EL NUEVO DIARIO. Manágua, 1 de
noviembre 2006.
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