[Laredva] “Não se pode submeter a realização do direito à EPJA a um cálculo perver so de quem deve se r priorizado”
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Mar Dic 1 17:24:12 UYST 2009
“Não se pode submeter a realização do direito à EPJA a um cálculo perverso de
quem deve ser priorizado”
No discurso de abertura da CONFINTEA VI, Marina Silva, a ex-Ministra do Meio
Ambiente do Brasil, relata sua experiência pessoal de alfabetização aos 16
anos e defende a valorização do saber narrativo na educação
Por Tatiana Lotierzo (FISC)
Marina Silva foi alfabetizada aos 16 anos. Nascida no Estado do Acre, na
Amazônia, foi a única de seus 14 irmãos a completar o ensino superior.
Historiadora, especializada em psicanálise e psicopedagogia, ela acentua que
foi graças a um desejo e uma falta que conseguiu levar adiante sua educação.
Em sua infância de criança da floresta, a educação informal era o que havia.
Educação que preparava meninos e meninas desde cedo para ajudar os pais nas
atividades da agricultura, extração do látex e cuidado com os animais.
O desejo de começar a estudar partiu de duas coisas: do sonho e da falta,
relata Marina. “Tinha o sonho de ser freira. Então minha avó, que era
analfabeta mas muito inteligente, então me disse: ‘Mas freira não pode ser
analfabeta’”, conta a palestrante. Foi então que decidiu que queria ser
alfabetizada.
A falta, diz Marina, foram três: de uma educação escolar, de saúde – teve
malária cinco vezes e hepatite, três, o que a deixou impossibilitada de
trabalhar – e da mãe, que faleceu quando a ex-ministra tinha 14 anos.
Marina Silva também lembrou uma história de cordel que sua avó gostava de
contar. A senhora havia aprendido de memória essa fábula ao escutar pela
primeira vez, e a repetia cantando sempre que tinha oportunidade.
A história era a do desafio de cantoria entre Romano, estudioso e apaixonado e
Inácio, caboclo analfabeto do sertão. A regra do desafio, realizado em praça
pública, era falar sobre as espécies da caatinga – tema que Inácio conhecia
muito bem.
Durante o desafio, ao perceber que está perdendo, Romano quebra as regras.
Começa a falar sobre linguagem cientifica, astronomia. Inácio se rende e perde
a cantoria: “Se desse um nó em martelo, via o preto desatá-lo, mas como viu em
ciência, cante só que eu me calo”.
A história trazia desmistificação, diz Marina: “desmistificava, pois mesmo as
pessoas inteligentes podem ser enganadas por quem não cumpre as regras. Se
Inácio soubesse ler e escrever, podia ter ganho o desafio”, concluiu.
E assim, motivada principalmente pela avó, a adolescente decidiu partir para a
cidade, para cuidar da saúde, virar freira e resolver seu problema de
analfabetismo. Tinha 16 anos.
A primeira vez que viu uma escola foi em 1975, quando tinha 16 anos e meio. O
curso era voltado para pessoas expulsas dos seringais. Adotavam um método
chamado MOBRAL, que não valorizava o universo simbólico dos/as estudantes.
Ao ver a professora ensinando fonemas, Marina resolveu criar um raciocínio
matemático para aprender letras pelo som e formar palavras – “passei a
madrugada somando o som das letras, mas em três dias, conseguia ler”,
declarou. Quinze dias depois, a professora avaliou que devia ir para outra turma.
Há mais detalhes no relato, mas fato é que na prova final, dos 46 alunos na
turma, passaram apenas 3. Marina Silva estava entre eles.
Com toda sua experiência pessoal, ela identifica que boa parte dos adultos
desistem das salas de aula durante o processo de alfabetização. E defende que
se aproveite o enorme potencial dos educadores não-formais especializados que
existem no Brasil. “É preciso descobrir os espaços não-formais de
aprendizagem”, diz. “Perceber que há o saber científico, mas também há o saber
narrativo, que deve ser valorizado”. E por fim, que não se pode transformar a
Educação de Pessoas Jovens e Adultas em uma questão de contabilidade, entrando
numa fila junto com a educação infantil ou o ensino médio. “Não se pode
submeter a realização do direito à EPJA a um cálculo perverso de quem deve ser
priorizado”, defende.
CONFINTEA VI
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